Um traço une os cinco primeiros ministros anunciados pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula de Silva (PT): a confiança solidificada ao longo dos últimos anos. Não são indicações partidárias, ainda que Fernando Haddad (Fazenda) e Rui Costa (Casa Civil) sejam dois dos principais quadros do PT, e Flávio Dino (Justiça) tenha trocado o PCdoB pelo PSB de Geraldo Alckmin.
Confiança é a principal credencial de Haddad para comandar o Ministério da Fazenda, não sendo expert em economia. Lula não quis repetir o erro de Dilma Rousseff, que nomeou Joaquim Levy para tentar ganhar a confiança do mercado e a relação se deteriorou em poucas semanas.
Ao escolher Haddad, Lula está dizendo ao mercado que a política econômica será dele e não do ministro. Questionado sobre o perfil do futuro titular do Planejamento, o futuro presidente respondeu que será alguém com conhecimento de planejamento e orçamento e, ressaltou, afinado com Haddad.
A relação com Dino também é antiga. Governador do Maranhã que quebrou a hegemonia da família Sarney, ele é amigo de Lula e lhe foi fiel na alegria do poder e na tristeza da prisão.
A ordem é colocar ordem na Polícia Federal (PF) e na Polícia Rodoviária Federal (PRF) e restabelecer as premissas do Estado Democrático de Direito. O homem forte da PF será o delegado gaúcho Andrei Rodrigues, outro homem de extrema confiança de Lula desde os primeiros governos.
Rui Costa é dos cinco anunciados nesta sexta-feira (9) o político por excelência. Ex-governador da Bahia, petista histórico, bom de diálogo, será o interlocutor do governo nas negociações com o Congresso. Ainda não está definida a divisão de tarefas nos ministérios instalados no Palácio do Planalto, mas o perfil de Rui Costa indica que, além da relação política, poderá ser escalado para coordenar a relação entre as pastas.
José Múcio Monteiro, o ministro da Defesa, é outro velho conhecido de Lula. À confiança do presidente agrega uma característica essencial para o cargo: o respeito das Forças Armadas. Na tarde desta sexta, exercitará sua capacidade de diálogo no primeiro encontro de Lula com os comandantes já escolhidos para o Exército, a Marinha e a Aeronáutica.
Por fim, o futuro ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, que não estava presente ao anúncio porque ainda ocupa o posto de embaixador na Croácia, é antítese do desastrado Ernesto Araújo, o chanceler de Jair Bolsonaro que o Itamaraty jamais tolerou. Afinado com Lula e com o ex-ministro Celso Amorim, Vieira terá a missão de restabelecer laços desfeitos pela política externa de Bolsonaro e consolidar as relações com os parceiros preferenciais do Brasil.
Inventário da herança
Antes de anunciar os primeiros ministros, Lula disse que no dia 20 ou 21 de dezembro, encarrada a transição, apresentará um balanço da situação herdada do governo atual, "sem show de pirotecnia":
— É para que a sociedade saiba como está a saúde, a educação, a ciência e tecnologia. Se não apresentarmos agora, seis meses depois estarão nas nossas costas os desmandos que eles fizeram no governo.
Em seguida, reforçou o discurso de que não tem o direito de errar:
— Não temos o direito de frustrar uma parcela da sociedade que espera a recuperação do Estado brasileiro. Não temos o direito de não fazer a coisa correta.
Música para prefeitos e governadores
Uma das promessas feitas por Lula na breve manifestação durante o anúncio dos primeiros ministros soa como música para prefeitos e governadores:
— Vamos recuperar a relação federativa. Não é possível a União ir bem se as prefeituras e os Estados forem mal.
Ministério da Segurança
No primeiro momento, Flavio Dino vai assumir o Ministério da Justiça com todas as suas funções, mas, no futuro, Lula planeja recriar o Ministério da Segurança Pública.
O futuro presidente disse que vai retomar o Pronasci, "criado por Tarso Genro". O Pronasci era um programa integrado de segurança pública, executado em conjunto com os Estados.
Garrafinha secreta
Bem-humorado no anúncio dos primeiros ministros, Lula puxou uma garrafinha de água ao constatar que, por não ter tomado posse ainda, ninguém providenciara um copo d'água.
— Meu adversário achava que era cachaça. Mesmo no tempo eu que eu gostava, tomava no copo e não na garrafa.