O mais importante na carta em defesa do Estado Democrático de Direito, assim como nos manifestos da Federação das Indústrias de São Paulo, da Associação Nacional de Jornais e de outras entidades não é o número de assinaturas nem a quantidade de pessoas que compareceram aos atos presenciais desta quinta-feira (11). É a rara a unidade de pessoas e instituições tão diferentes em favor de uma causa que pode parecer abstrata. Defender a democracia não é como ir às ruas pedir o impeachment de um presidente, como se viu na história recente, ou mesmo pedir “Diretas Já”, como no início dos anos 1980.
As ameaças à democracia não produzem imagens de impacto como as da devastação da Floresta Amazônica, do Pantanal em chamas ou dos garimpeiros explorando reservas indígenas. Às vezes pode ser um vídeo com notícias falsas divulgado na internet, ataques ao sistema eleitoral e às instituições, campanha sistemática contra um ou mais poderes da República. Foi a soma dessas delinquências praticadas por múltiplos atores, somadas ao episódio da invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, que acendeu o sinal de alerta entre os defensores da democracia. Se lá, que é uma democracia estável, um presidente derrotado atiçou os cães de suas redes contra o Congresso, o que dizer de um país com uma história de golpes e contragolpes como o Brasil?
A reunião do presidente Jair Bolsonaro com embaixadores para difamar o sistema eleitoral brasileiro e levantar suspeitas contra a urna eletrônica criou o ambiente para o nascimento de um movimento em defesa da democracia. A carta da Faculdade de Direito da USP, com quase um milhão de assinaturas, foi a materialização da preocupação com os rumos do país às vésperas de uma eleição que deveria ser rotina.
Bolsonaro e seus seguidores desdenharam da carta, tentando desqualificar os signatários, como se fossem todos dependentes de algum benefício que supostamente seu governo cortou. Nesse milhão de vozes estão ricos e pobres, empresários e empregados, alunos e professores, banqueiros e bancários, brancos e pretos, artistas e anônimos, cidadãos brasileiros que têm em comum o apreço pelos direitos civis, as liberdades individuais e a possibilidade de escolher seus representantes a cada quatro anos.
ALIÁS
Um dos sinais mais alarmantes de que a democracia brasileira corre perigo é a insistência de setores das Forças Armadas em fiscalizar as urnas eletrônicas, sugerindo até estultices como filmar o voto. Não é esse o papel que a Constituição reserva aos militares.