Se Jair Bolsonaro (PL) não tivesse sido eleito nos últimos 25 anos por esse sistema eleitoral que agora coloca sob suspeita, é possível que os embaixadores convocados para ouvir suas lamúrias nesta segunda-feira (18) saíssem do encontro com a pulga atrás da orelha. Mas ele foi e nunca levantou suspeitas sobre a urna eletrônica que lhe deu sucessivos mandatos, incluindo o de presidente da República, e elegeu o filho Zero 1 senador, o Zero 2 vereador e o Zero 3 deputado federal, o mais votado de São Paulo em 2018.
A reunião com os embaixadores, marcada por críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no momento em que todas as pesquisas de opinião o colocam em desvantagem, soa mais como uma tentativa de criar confusão para justificar eventuais atos de contestação ao resultado da eleição. Não é de hoje que Bolsonaro coloca o sistema eleitoral sob suspeita e diz que só Deus pode tirá-lo do Palácio do Planalto. Fica subentendido que Deus não poderá fazer isso por meio do voto, porque de antemão o presidente decidiu que o único resultado possível é sua reeleição.
Ainda que as pesquisas possam mudar até 2 de outubro, hoje todas guardam coerência entre si e indicam que o grande adversário de Jair Bolsonaro é ele mesmo e não os outros concorrentes. Porque mesmo os que amargam índices baixíssimos de intenção de voto no primeiro turno ganhariam dele no segundo. A explicação não pode ser mais simples: ainda que tenha cerca de 30% de eleitores fiéis e apaixonados, há 55% ou mais que não votariam nele de jeito nenhum. A isso em pesquisa se chama rejeição, mas Bolsonaro só acredita nos apoiadores que participam de suas redes sociais ou de motociatas, passeatas, carreatas e outros comícios disfarçados de apoio a seu governo.
Os embaixadores, se é que o presidente não sabe, acompanham a política nos países em que atuam por todos os meios e não apenas pelo que ouvem de fontes oficiais ligadas aos governos. Seus diplomatas produzem relatórios consistentes e contextualizados. Reportam golpes em preparação, alertam para o risco de convulsões sociais, traçam cenários eleitorais, informam nos detalhes quem é quem no jogo político.
Se houver no Brasil alguma coisa parecida com a invasão do Capitólio, os Estados Unidos apoiarão? É certo que não. Em caso de golpe, a União Europeia seguirá comprando produtos brasileiros como se a democracia não tivesse sido ferida? Ou basta ao presidente o apoio da Rússia, da Hungria e de meia dúzias de países fora dos tradicionais parceiros comerciais do Brasil para seguir governando se não for vitorioso nas urnas?
Aos embaixadores Bolsonaro não apresentou provas das acusações requentadas que fez. Repetiu o discurso de suas lives de quinta-feira e das afirmações que repete para os apoiadores no cercadinho do Palácio da Alvorada. É uma diplomacia às avessas, que os profissionais do Itamaraty jamais assinariam embaixo.