Um pedido de vista adiou a apreciação, na Comissão de Constituição e Justiça, de mais uma dessas aberrações que avançam no Congresso e, quando o país percebe, viraram lei. O alvo da ganância política agora é o Itamaraty, uma área estratégica para a imagem externa do país.
Trata-se de um remendo à Constituição para permitir que parlamentares possam ser nomeados embaixadores sem precisar renunciar ao mandato. Não bastasse a já existente possibilidade de pessoas sem qualquer preparo para a diplomacia ocuparem embaixadas e outros postos no Exterior por indicação política, a emenda prevê que apenas se licenciem, como se estivessem ocupando um ministério qualquer.
A proposta absurda revoltou os diplomatas de carreira que estudam anos a fio para passar no concurso do Instituto Rio Branco, preparam-se para uma função extremamente delicada e estratégica e correm o risco de ser substituídos por um deputado ou senador qualquer, para a facilitar os arranjos políticos de interesse do presidente da vez.
A título de ilustração, convém lembrar que, se já estivesse em vigor quando o presidente Jair Bolsonaro tentou fazer do filho mais jovem, o deputado Eduardo Bolsonaro, embaixador nos Estados Unidos, o rapaz poderia ter se mudado para o Washington sem perder o mandato. À época, Bolsonaro recuou porque foi alertado para o risco de o filho ser reprovado na sabatina do Senado. Com a emenda em tramitação no Senado, um parlamentar poderia se candidatar à vaga, enfrentar a sabatina e, em caso de reprovação, voltar para a sua cadeira. Se aprovado, assumiria a missão diplomática no Exterior e deixaria o suplente em seu lugar.
O pedido de vista coletivo não encerra a polêmica, mas o adiamento dá tempo para que o país se mobilize contra mais esse ultraje. O senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente da CCJ, decidiu pautar a matéria na comissão sem aviso prévio. Em tempo, os demais integrantes frearam a maluquice, mas é preciso que, para o bem do Brasil, ela seja enterrada de vez.