A renúncia do deputado estadual paulista Arthur do Val (União Brasil), também conhecido por Mamãe Falei, deve servir de estímulo a uma reflexão sobre as excrescências que conquistaram mandatos em 2018 e 2020, na onda da antipolítica ou de um falso moralismo com toques messiânicos. Há nesse grupo bandidos como a deputada cassada Flordelis, que será julgada nos próximos dias pela acusação de matar o marido, valentões com cabeça de vento como o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) e, mais recente integrante desse antro de aberrações, o vereador Gabriel Monteiro (PL), do Rio, que deve perder o mandato pelo conjunto da obra: acusações de estupro, assédio sexual e moral, exploração de crianças, uso de recursos públicos para promoção pessoal e até falsas operações policiais para alimentar seu canal no YouTube.
De onde saiu essa gente que enxovalha a imagem da classe política por ocupar assentos no Legislativo? Ninguém caiu de paraquedas nos cargos em que só chegam os mais votados. Foram eleitores enganados por falsos profetas e criminosos fantasiados com a capa de “cidadão de bem” que apertaram seus números nas urnas eletrônicas e deram a tipos como esses um mandato com imunidade parlamentar e todos os benefícios inerentes.
Os anteriormente citados não são os únicos a comprovar que a Lei Tiririca estava errada: pior do que está, fica. Tiririca, pelo menos, foi eleito sem máscara. Pediu votos como palhaço, não vendeu a imagem de enviado de Deus. Não é o caso de Flordelis, a que se apresentava como mulher da igreja, mãe amorosa de filhos adotados e que, soube-se com o assassinato do marido, não era nada do que dizia ser.
A grande obra do fortão Daniel Silveira — ídolo dos filhos do presidente Jair Bolsonaro — antes de ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal e estimular atos antidemocráticos foi quebrar uma placa com o nome da vereadora Marielle Franco, do PSOL, assassinada no ano em que foi eleito deputado pelo PSL.
Arthur do Val foi eleito deputado estadual pelo DEM, na carona da onda de desmoralização dos políticos tradicionais pelo Movimento Brasil Livre, do qual era um dos expoentes. Com uma câmera na mão e, sabe-se agora, nenhuma ideia na cabeça, o ativista que deve envergonhar os verdadeiros liberais perseguia candidatos e assessores daqueles a quem considerava adversários. Veio de São Paulo tumultuar a campanha de 2016. Seguia Plinio Zalewski, um dos integrantes da campanha de Sebastião Melo (MDB) que, por razões até hoje incompreensíveis para os amigos, acabou se suicidando.
O moralista Arthur do Val foi para a Ucrânia, supostamente para ajudar o povo ucraniano diante das ameaças da Rússia, e acabou revelando em gravação inequívoca sua falta de caráter e de humanidade. Com a Ucrânia à beira de uma guerra que já matou milhares de pessoas e provocou um êxodo sem precedentes, o “mamãe” gravou mensagem como se estivesse na Ilha da Fantasia, feliz da vida porque as ucranianas, além de bonitas, eram fáceis por serem pobres.
A Câmara se livrou de Flordelis, a Assembleia de São Paulo acaba de se livrar de Arthur do Val, a Câmara do Rio há de expurgar Gabriel Monteiro, mas outras subcelebridades de redes sociais sem qualquer serviço relevante prestado à sociedade preparam-se para disputar as eleições de outubro. O parlamento não deveria ser lugar de parlapatão, mas eles só chegam lá porque milhares de pessoas escolhem o candidato sem prestar atenção na biografia.