Com uma filosofia de para-choque de caminhão, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, justificou a demora em comprar vacinas para crianças de 5 a 11 anos, autorizadas na quinta-feira pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Poderia ter repetido a frase de seu antecessor Eduardo Pazuello, que está nas entrelinhas da concordância em retardar a vacinação desse público, se assim os país desejarem: “Um manda e o outro obedece”.
Porque o presidente Jair Bolsonaro não quer a vacinação de crianças e faz campanha contra, o médico Marcelo Queiroga tenta ganhar tempo dizendo que "a pressa é inimiga da perfeição".
Não se pode acreditar que o problema seja mesquinharia, já que será preciso comprar essas vacinas — que são diferentes das aplicadas em adultos. O comportamento de Queiroga sugere apenas subserviência a um capitão que nada entende de medicina, mas desde o início da pandemia fala como se fosse do ramo, repetindo frases que colhe na internet e ouvindo médicos que navegam na contramão da maioria da comunidade científica. Foi assim com a cloroquina, ouso de máscaras, o distanciamento social, a vacina para adultos (que comprou porque não teve como evitar) e agora a imunização de crianças.
Se a pressa é inimiga da perfeição, em se tratando de uma vacina testada e que está sendo usada em larga escala nos países desenvolvidos (mais de 7 milhões de crianças já foram vacinadas nos Estados Unidos), o atraso seria amigo de quem? Do vírus? Do pequeno grupo de médicos antivacina?
Na reunião da Câmara Técnica Assessora de Imunização, na sexta-feira (17), ficou evidente a pressão do Ministério da Saúde para que os técnicos adiassem qualquer deliberação sobre o a vacinação de crianças antes de ouvir o grupo de 45 médicos que encaminhou uma série de questionamentos à Anvisa e requereu, sem sucesso, que a agência não desse a autorização na quinta-feira passada. A secretária extraordinária de combate à pandemia, Rosana Leite de Melo, defendeu um amplo debate para “ouvir o outro lado” antes de comprar as doses e iniciar a vacinação.
O “outro lado” seria exatamente esse grupo de 45, encabeçado pela perita médica Maria Emília Gadelha e pelo pediatra Edmilson Migowski. A Anvisa desconheceu o pedido e, ao ser questionado numa entrevista à Rádio Gaúcha, o presidente da Agência, Antônio Barra Torres, disse que para ele importava mais ter o aval de sociedades médicas, como a de Pediatria e Imunologia, do que opiniões de médicos que fazem campanha contra a vacina. Integrantes desse grupo também defendem tratamentos alternativos, como ozonioterapia, cloroquina, e outras medicações sem eficácia comprovada.
A câmara técnica ignorou as pressões e, ainda no sábado, divulgou parecer reforçando o apoio à decisão da Anvisa e solicitando que o Ministério da Saúde adote as providências necessárias à imunização o mais rapidamente possível. A Anvisa garante que a vacina é segura para crianças, passou por todas as fases de testes e está sendo aplicada em diversos países, entre os quais Estados Unidos e Canadá.
Em setembro, o governo também tentou retardar a vacinação dos adolescentes de 12 a 17 anos, mas a pressão das famílias e dos governos estaduais obrigou o ministro a recuar. A diferença é que para esse público a vacina é a mesma dos adultos e os Estados e municípios poderiam se rebelar e usar. No caso das crianças de cinco a 11 anos, é outra e precisa ser comprada. O governo de São Paulo tentou negociar direto com a Pfizer, mas a farmacêutica disse que prefere tratar com o governo federal.
Aliás
Se os estudos indicam que a vacina é segura para crianças, que o governo compre as doses e deixe a escolha a critério das famílias. Milhões de pais e mães aguardam essa iniciativa para vacinar seus filhos. Os que não querem, que se responsabilizem pelos seus.
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