Pense com o cabeça, e não com o fígado ou com o coração de militante político: o que ganharia um governador retendo vacinas que já deveriam ter sido aplicadas nos cidadãos do seu Estado? Nada. Ao contrário, apenas se desgastaria. Essa mentira de que os governadores estão estocando vacinas, repetida tantas vezes por aliados do presidente Jair Bolsonaro, incluindo seus filhos e o ministro Onyx Lorenzoni (veja publicações abaixo) acaba confundindo os incautos e sendo usada de má fé pelos espertos.
Aos fatos. No Rio Grande do Sul, um dos alvos da mentira bolsonarista, o Ministério da Saúde já entregou 2.861.600 doses de vacinas, entre CoronaVac e AstraZeneca. Sabe quantas doses há em estoque na central de armazenamento e distribuição? Exatamente 14.530 (o equivalente a 0,5%), que fazem parte da reserva de contingência determinada pelo Ministério da Saúde. As outras 2.847.070 foram todas entregues aos municípios, que estão aplicando diariamente de acordo com a sua capacidade.
Por que a diferença tão grande com o que aparece no site do Ministério da Saúde? Porque o ministério inclui no sistema os números de doses enviadas no momento em que manda os lotes para os Estados. As prefeituras, responsáveis pela vacinação, não conseguem fazer o lançamento dos dados da aplicação em tempo real. E não conseguem exatamente porque deram prioridade à aplicação das vacinas, em detrimento do processo burocrático de alimentar o banco de dados Ministério da Saúde as informações dos vacinados.
Responsável pela vacinação em Porto Alegre, o coordenador da Vigilância em Saúde , Fernando Ritter, atesta que é verdadeira a afirmação da secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, e da coordenadora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, Cynthia Molina Bastos: o Estado não estoca vacinas.
—Quando as vacinas chegam, são conferidas, embaladas e distribuídas para as coordenadorias regionais o mais rápido possível, numa operação que conta até com a ajuda do Exército — repete Cynthia, sempre que é questionada sobre o boato.
O ritmo de vacinação difere de município para município, mas nenhum “estoca” vacina. Os responsáveis nas prefeituras apenas tratam de assegurar que não falte a segunda dose para os que estão completando 21 dias do recebimento da primeira, no caso da CoronaVac. A segunda dose do imunizante da AstraZeneca é aplicada três meses depois da primeira.
Em Porto Alegre, a defasagem entre o número de vacinas aplicadas e o lançado no sistema do Ministério da Saúde chegou a 75 mil no fim de semana. Com um mutirão nos últimos dias, baixou para 50 mil. Em outros municípios, a demora no lançamento dos dados é maior.
— Priorizamos a aplicação da vacina. Como o sistema do Ministério da Saúde é muito lento, optamos por anotar os dados à mão, numa planilha, que depois é digitada no computador — explica Fernando Ritter.
Para tentar acabar com os boatos sobre a estocagem de vacinas, a prefeitura vai colocar computadores no drive thrus e a digitação dos dados será feita direto no sistema do Ministério. O mesmo ocorrerá nas Unidades Básicas de Saúde. Com isso, o cidadão que vai se vacinar deve se preparar para ficar mais tempo na fila. Ritter explica por quê:
— Além de o sistema do Ministério da Saúde ser lento, se a pessoa não está cadastrada no SUS, o atendente terá de preencher todo o cadastro.
Aliás
O lançamento dos dados é lento porque, diferentemente da vacina da gripe, em que apenas se informa o número de doses aplicadas, no caso do coronavírus é preciso digitar nome, CPF, data de nascimento, endereço e telefone da pessoa imunizada.