O fato de ter um currículo modesto para os padrões esperados de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) é o menor dos problemas do desembargador Kassio Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga de Celso de Mello. Repete-se com o escolhido para o STF o que ocorreu com o professor Carlos Alberto Decotelli, que caiu logo depois de assumir o Ministério da Educação por ter enfeitado o currículo com títulos que não tinha.
Decotelli durou cinco dias no cargo (de 25 a 30 de junho), e não conseguiu se manter depois da comprovação de que mentira ao incluir um doutorado na Argentina e um pós-doutorado na Alemanha e dos indícios de plágio em sua tese de mestrado. Marques vai para a sabatina no Senado com a credibilidade arranhada pela suspeita de que cometeu os mesmos deslizes. Como confiar em um ministro do Supremo Tribunal Federal que transforma em pós-doutorado um cursinho de extensão de cinco dias?
Enfeitar currículo para parecer mais preparado do que é está virando rotina entre autoridades brasileiras. O ex-juiz Wilson Witzel, governador afastado do Rio, mentiu sobre uma passagem pela Universidade de Harvard e foi desmascarado. Decotelli caiu poucos dias depois de assumir porque o reitor da Universidade de Rosário, Franco Bartolacci, foi para o Twitter esclarecer que ele não concluíra o doutorado em Administração.
O pós-doutorado na Universidade de Wuppertal, na Alemanha, também não passava de um breve período de estudos, sem o título incorporado ao currículo Lattes. O ex-ministro também foi acusado de plagiar a dissertação de mestrado na Fundação Getulio Vargas.
Kassio Marques deveria ter aprendido com Decotelli que a mentira tem pernas curtas, mas não. Na falta de títulos robustos e de obras de referência, maquiou o currículo com diplomas que não tem. A informação de que é mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Messina (Itália) está superestimada: a instituição informou que o magistrado participou apenas de um ciclo de seminários, equivalente no Brasil a uma simples especialização. O “postgrado em Contratación Pública” pela Universidade de La Coruña foi tão somente um curso de extensão.
A última do talvez futuro ministro (talvez, porque o Senado pode barrá-lo) é uma suspeita de plágio na tese de mestrado na Universidade de Lisboa. No trabalho foram identificados trechos inteiros de um artigo de Saul Tourinho Leal, incluindo um erro de grafia. Namíbia (o país) foi escrito "Naníbia" no artigo de Saul Tourinho Leal e assim apareceu na dissertação de Marques.
Pode ser ministro da Suprema Corte um homem que não respeita a verdade nem o direito autoral? Com a palavra os senadores, a quem caberá referendar a indicação. Se derem o aval, Marques poderá ficar no Supremo por longos 27 anos. Para a vaga de um homem sábio como Celso de Mello, a substituição é quase um acinte, mais ainda quando se sabe que a indicação foi articulada pelo enrolado advogado Frederick Wassef e seu ex-cliente Flavio Bolsonaro, filho do presidente da República.
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