A uma semana da votação da proposta de reforma tributária, o governo de Eduardo Leite ainda não tem os 28 votos necessários. As mudanças anunciadas na segunda-feira (14) foram insuficientes para quebrar as resistências entre os aliados e a resposta de um deles, o MDB, foi o anúncio de que votará contra. Isso não significa que a mudança no sistema tributário está morta, porque uma semana antes o governo também não tinha votos suficientes para aprovar as reformas previdenciária e administrativa. Desta vez, porém, os obstáculos se multiplicam.
Com os sindicatos fragilizados e os servidores sem qualquer poder de barganha, as mudanças na Previdência e nas carreiras foram aprovadas com o aplauso das federações empresariais e os votos de deputados que agora rejeitam a reforma tributária, como os do MDB, do PSL e do Novo.
Os adversários do projeto conseguiram emplacar nas redes sociais a narrativa de que se trata de aumento de carga tributária, embora os cálculos indiquem que o peso será o mesmo de hoje, com as alíquotas vigentes desde 2016.
O aumento, portanto, não é em relação ao que se paga hoje, mas à expectativa de redução criada quando Leite pediu a prorrogação, por dois anos, das alíquotas majoradas no governo de José Ivo Sartori. À época, o governador recém eleito pediu esse prazo para ter tempo de elaborar uma reforma mais ampla, sem dizer como seria. Floresceu a ideia mágica de que haveria redução da carga tributária, mesmo com as contas no vermelho.
A decisão do MDB mistura a convicção de deputados como Edson Brum, que sempre vota contra qualquer aumento de imposto, ao interesse eleitoral dos dois que são candidatos a prefeito (Fábio Branco em Rio Grande e Carlos Búrigo em Caxias do Sul) e à mágoa coletiva que vem da campanha de 2018.
Duas expressões usadas por Leite à época são consideradas decisivas para a derrota de Sartori: a de que o pagamento dos servidores em dia era questão de “fluxo de caixa” e a de que para resolver a crise do Estado o governador precisava “levantar a bunda da cadeira”. Os problemas, como sabe quem acompanha minimamente a situação do Estado, exigem soluções bem mais complexas.
Oficialmente, o MDB fechou questão contra a reforma por entender que não há risco de colapso nos serviços, por cinco motivos: o Estado recebeu R$ 2 bilhões de socorro emergencial do governo federal, a reforma previdenciária renderá R$ 1 bilhão por ano, a Assembleia autorizou o uso do fundo previdenciário no pagamento dos aposentados e pensionistas (seriam R$ 2,2 bilhões, segundo o partido), a receita de ICMS ficou R$ 189 milhões acima da de 2019 em agosto e em 2021 o Estado pode vender a CEEE, a Sulgás, a CRM e a Banrisul Cartões.
Detalhe: o auxílio emergencial já acabou, o fundo previdenciário não cobre três meses das aposentadorias e a crise decorrente do coronavírus ainda está longe de ser superada.
Embora seja possível aprovar um projeto sem os votos do MDB, o problema do governo é o impacto nas outras bancadas da base aliada. Se o partido que ocupa uma das secretarias mais cobiçadas, a dos Transportes, vota contra, por que outro se desgastaria com seu eleitorado votando a favor de um projeto que aumenta o IPVA e eleva o ICMS de parte dos produtos e serviços para compensar a redução de outros?
Leite usa argumentos sólidos para defender a necessidade da reforma, a começar pelo risco de atrasos ainda maiores no pagamento de salários e do colapso nos serviços públicos. Conseguiu aval de economistas renomeados e de integrantes do governo federal e apoio de prefeitos e de empresários como Daniel Randon, mas as resistências persistem. Para compensar as baixas na base aliada, terá de conquistar adeptos na oposição, a começar pelo PDT, que votou contra outros projetos, mas admite estudar a proposta com serenidade.
Aliás
Os dois deputados do Novo, que fazem a oposição mais articulada à proposta de reforma tributária, não se comovem com o argumento de que em Minas Gerais, único Estado governado pelo partido, Romeu Zema pediu e a Assembleia aprovou em 2019 a renovação de um aumento de ICMS.