A derrota do prefeito Nelson Marchezan na abertura do processo de impeachment estava desenhada desde a véspera, mas nem o mais pessimista dos aliados imaginava um placar tão avassalador: foram 31 votos a favor da admissibilidade do requerimento e apenas quatro contrários. Bastavam 19 votos para que o processo fosse aberto, mas os adversários do prefeito mostraram que têm força suficiente para derrubá-lo na votação final, impedindo não só que termine o mandato, mas que dispute qualquer cargo nos próximos oito anos.
Desde as primeiras manifestações dos vereadores, ficou claro que Marchezan seria derrotado, porque ficou irremediavelmente só na Câmara de Vereadores. Com o desmonte da base de apoio a partir do rompimento com o PP, que tem o vice Gustavo Paim como candidato a prefeito, Marchezan foi se isolando mais e mais.
A pandemia que tirou protagonismo da Câmara ampliou o fosso entre o Executivo e o Legislativo. Marchezan montou seu comitê de enfrentamento ao coronavírus e, desde março, o diálogo com os vereadores foi interditado. Os projetos que mandou para a Câmara na tentativa de salvar o transporte coletivo — e os outros que ainda precisam ser votados — devem ser rejeitados ou continuar no limbo.
Para além das divergências entre o prefeito e os vereadores, há um fato que se sobrepõe a qualquer outro: pelo menos 30 dos 31 vereadores que votaram pela abertura do processo já têm seu candidato à eleição de novembro — e não é Marchezan. Dois vereadores são pré-candidatos à prefeitura: Valter Nagelstein (PSD) e Nádia Gerhard (DEM).
Cálculos extraoficiais de aliados dos prefeitos mostram como estão divididos os vereadores no apoio aos pré-candidatos:
- José Fortunati (PTB) - 6 vereadores
- Manuela Dávila (PCdoB-PT) - 4
- Nádia Gerhard (DEM) – 4
- Sebastião Melo (MDB ) - 3
- Gustavo Paim (PP) – 3
- Juliana Brizola (PDT) – 3
- Fernanda Melchiona ( PSOL) - 3
- Valter Nagelstein (PSD) – 2
- João Derly (Republicanos) - 2
Há outro fator que não pode ser desconsiderado na análise da rejeição em massa ao prefeito: o fato de Marchezan não ter liberado as emendas parlamentares de R$ 1 milhão por vereador. O prefeito tentou, sem sucesso, derrubar na Justiça as emendas impositivas, o que tiraria dos candidatos a chance de garantir obras em seus redutos eleitorais ou destinar recursos diretamente a instituições com as quais se identificam.
Pra complicar a situação de Marchezan, os empresários descontentes com as medidas restritivas em Porto Alegre passaram a fazer campanha pelo impeachment. O objeto é o que menos importa. Assim como Dilma Rousseff em 2016, que foi afastada com o pretexto das pedaladas fiscais, mas caiu pelo conjunto da obra e porque não tinha maioria na Câmara, Marchezan corre o risco de ser afastado no apagar das luzes de seu mandato porque rompeu as pontes com os vereadores, desmanchou feudos, recusou-se a aceitar indicações para cargos e achou que podia governar sem a Câmara.
ALIÁS
O golpe na candidatura de Marchezan, que teria boas possibilidades de disputar o segundo turno das eleições para prefeitura da Capital, zera o jogo em Porto Alegre. Sem favoritos, os pré-candidatos terão de correr atrás de alianças para ampliar o tempo de TV e engordar o orçamento da campanha com dinheiro do fundo eleitoral.