Só o populismo combinado com a ignorância sobre a crise fiscal explica o que ocorreu no Senado na quarta-feira (20), com a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro ao artigo que abre caminho para o reajuste de servidores em 2021. O congelamento dos salários até o final e 2021 era uma das contrapartidas negociadas pelo ministro da Fazenda, Paulo Guedes, ao socorro de R$ 60 bilhões para Estados e municípios enfrentarem a pandemia de coronavírus e compensarem parte da perda de arrecadação.
Dos três senadores gaúchos, somente Luis Carlos Heinze (PP) votou pela manutenção do veto. A posição de Paulo Paim (PT) não surpreendeu, porque historicamente o senador não é adepto de ajustes fiscais. A ex-presidente Dilma Rousseff costumava brincar que precisaria de um orçamento exclusivo para bancar os projetos de Paim, que os apresentava sem se preocupar com o custo para o país.
Surpreendente foi o voto do senador Lasier Martins (Podemos), que sempre fez discurso contrário à gastança e aos privilégios dos servidores públicos. Lasier justificou a possibilidade de concessão de reajuste do projeto não obrigatória nem automática.
— Meu voto levou em consideração a exceção prevista no projeto, que incluía a área da saúde, que está na linha de frente do combate à pandemia — afirmou o senador.
Com o emprego garantido pela estabilidade e, em geral, com salários superiores, na média, aos pagos pela iniciativa privada, os servidores podem, sim, dar uma quota de sacrifício e ficar até o final e 2021 sem reajuste. Dramática mesmo é a situação dos trabalhadores do setor privado que perderam ou perderão o emprego e terão dificuldade para conseguir outro.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que costura um acordo pela manutenção do veto na Casa que comanda, tem pela frente uma tarefa árdua. Porque a responsabilidade fiscal também não é muito popular entre os deputados. Fosse um período normal, de sessões presenciais, as galerias certamente estariam tomadas por líderes sindicais pressionando os parlamentares a derrubarem o veto para, logo depois, iniciar a campanha por reajustes.
É fato que existe inflação e que ela corrói o poder de compra dos salários, mas 2020 é um ano atípico, que não pode ser olhado pelas lentes de um período normal. Tudo o que se gastou com o enfrentamento à covid-19 — da compra de respiradores e equipamentos de proteção individual aos repasses para Estados e municípios — não estava nas previsões. Tampouco estava a concessão do auxílio emergencial, necessário para evitar que milhões de brasileiros morressem de fome nesse período de exceção.
Orientado por Guedes, Bolsonaro vetou um ponto crítico para o equilíbrio das contas não apenas da União, mas dos estados e municípios, que já estavam quebrados e tiveram de arcar com despesas inesperadas.
Pelos cálculos do Ministério da Economia, o impacto da derrubada do veto (se confirmada na Câmara) será de R$ 132 bilhões, valor equivalente a quatro vezes o que o governo gasta com o Bolsa Família.
Os senadores não perceberam — e os deputados ainda têm tempo para compreender — que para cobrir o rombo que estão abrindo será necessário aumentar impostos, punindo toda a sociedade, que já arca com uma carga tributária das mais pesadas do mundo.
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