Entre a apresentação do plano de distanciamento controlado e a entrevista do governador Eduardo Leite foram mais de duas horas. Sinal da complexidade da proposta, que pode ser traduzida como uma saída planejada do distanciamento social, mas com travas para tentar manter a situação sob controle. O grau de detalhamento do plano indica que o governo do Rio Grande do Sul não está navegando às cegas, como disse o ministro da Saúde, Nelson Teich, em declaração genérica sobre o enfrentamento do coronavírus no país.
O plano de distanciamento controlado foi montado a partir de dados sobre a incidência da covid-19 em cada região do Estado, combinado com a situação das UTIs. A equipe da Secretaria de Planejamento que coordenou o estudo usa os dados reais de internações e testes positivos e a pesquisa da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que a cada 15 dias fornece um retrato da situação, com projeções para todo o território.
Não há qualquer garantia de que a liberação gradual das atividades econômicas ocorrerá sem solavancos, nem que o plano seja capaz de evitar uma explosão de casos. O governo do Estado define a situação de cada região, para estabelecer os níveis de restrição, e os prefeitos editam os decretos dentro desse marco. Para cada setor da a economia haverá um protocolo que terá de ser seguido à risca.
O governo atribuiu pesos diferentes aos setores econômicos de acordo com o risco de transmissão e a relevância para a economia. Isso permite forçar a mão para abrir setores mais importantes, mas garante que se possa restringir as atividades dos que não têm tanto peso econômico mas que geram concentração de pessoas.
O sucesso do plano dependerá da adesão dos prefeitos, das empresas e da população em geral. Porque não há estrutura para fiscalizar o cumprimento. O Ministério Público, por mais empenhado que esteja em garantir o cumprimento das regras, tem limites para atuar.
A primeira reação dos setores empresariais que clamavam pela liberação foi positiva, ainda que os protocolos ainda estejam em construção e que as restrições ainda sejam bastante severas. Leite só afrouxou o isolamento porque o Rio Grande do Sul obteve bons resultados com as medidas iniciais e hoje está entre os Estados com melhor situação no país. Há vagas na UTIs e o número de mortes é relativamente baixo, comparado a outros Estados. Se o número de casos disparar, os prefeitos serão forçados a retroceder.
Politicamente, o governador também está preparado para um aumento repentino de casos e mortes. Se precisar, pode voltar a decretar o fechamento de tudo o que não for essencial caso a pandemia evolua rapidamente. Tem o argumento para eventuais pressões em mãos: o plano foi discutido com a sociedade e com os empresários e todos ajudaram a decidir os critérios adotados.
Aliás
Mesmo com a pressão de deputados cristãos, Eduardo Leite manteve até dia 5 as restrições à aglomeração nas igrejas. Pelo menos por mais uma semana, segue proibida a reunião de mais de 30 pessoas por templo. Depois, a responsabilidade será dos prefeitos de cada cidade, levando em conta o protocolo estadual.