Do Central Park e dos arredores da Estátua da Liberdade, dois dos lugares mais icônicos de Nova York, vieram as imagens do dia: um navio hospital com mil leitos chegando à cidade e barracas para atender pacientes sendo montadas no gramado onde, por esta época de primavera recém-nascida, americanos e turistas se esparramam para tomar sol depois do longo inverno. Com o caos nos hospitais, a principal cidade dos Estados Unidos é o retrato da derrota para um vírus que o presidente Donald Trump subestimou.
Na Babel contemporânea, que recebe gente de todos os cantos do planeta, o coronavírus encontrou terreno fértil para se propagar. Não haverá um dia, como September, 11 para esculpir em pedra. Talvez o número para a História seja 2020, o ano em que a peste silenciou a cidade que não parava nunca. O número de mortos nos Estados Unidos se aproxima do 11 de setembro e Trump agora pede que a população fique em casa.
No sul da América, o presidente brasileiro resiste como o último negacionista entre os líderes de grandes países. Até o populista de esquerda López Obrador, do México, já se rendeu.
Depois do Twitter, foi a vez do Facebool e do Instagram apagarem postagens do presidente brasileiro por ameaça à saúde pública. Na TV, nova entrevista que merecia o carimbo “vergonha alheia”. O presidente insiste que os governadores estariam inflando o número de mortos por coronavírus, para fazer política ou para arrancar dinheiro do governo federal. Há um que de demencial na afirmação, já que os números de outros países são avassaladores e o próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, admite que pode estar ocorrendo o contrário: que o número de contaminados seja maior e o de mortos também, dado que há escassez de testes.
Para afastar os maus pensamentos em relação ao avanço da pandemia, fui fazer o que chamo de ronda noturna: caminhar pelo pátio do edifício, na tentativa de desatrofiar os músculos contraídos pela falta de exercício.
Vinte anos morando neste prédio e nunca me ocorreu caminhar à noite, protegida pelas grades. O espaço sempre pareceu pequeno, mas agora, comparado ao apartamento, é um latifúndio. Daqui, vejo as janelas do Hospital Femina e me ocorre que um bebê pode estar vindo ao mundo. Que uma jovem mãe pode estar em trabalho de parto. E que só isso já é motivo para ter esperança no dia em que o número contaminados no Brasil subiu para 4.579, com 159 mortes.