A vacina contra a dengue é relativamente recente. Foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2 de março de 2023. O Ministério da Saúde só anunciou sua incorporação ao Sistema Público de Saúde nove meses depois, em dezembro, após parecer favorável da Comissão Nacional de Incorporações de Tecnologias no SUS (Conitec). E o produto apenas começou a ser disponibilizado agora, em 2024.
Desde o início, ficou claro, nas palavras da ministra da Saúde, Nísia Trindade, que, embora o Brasil seja o primeiro país do mundo a oferecer esse imunizante no sistema público, a vacinação seria focada em público e regiões prioritárias, que seriam definidas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) e pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI). É tanta sigla, que parece burocracia. E, um pouco, o é.
A estratégia de utilização dos imunizantes disponíveis leva em conta os locais com maior incidência da doença. Assim, o Rio Grande do Sul ficou de fora. Não foi contemplado nessa lista, anunciada em 25 de janeiro de 2024.
Nove dias depois, na segunda-feira passada, 5 de fevereiro, o Estado confirmou a primeira morte em decorrência de dengue em 2024: uma mulher de 71 anos, em Tenente Portela. Ela morreu em 31 de janeiro.
No dia seguinte à confirmação da primeira morte, na terça-feira (6), foi anunciada a segunda: um homem de 65 anos, morador de Santa Cruz do Sul. O óbito ocorrera no dia 1º.
Na mesma terça, a secretária estadual da Saúde, Arita Berhamnn, afirmou, no programa "Gaúcha Atualidade", da Rádio Gaúcha, que 466 municípios gaúchos estão infestados pelo mosquito Aedes aegypti, ou seja, 93% do total do território gaúcho.
Se, ao contrário do imunizante contra o coronavírus, no caso da dengue existe a vacina, por que o Estado não se antecipou e buscou comprá-la?
Arita explicou na Gaúcha que "vacina é sempre um programa federal".
- Nós nem tentamos comprar porque as evidências são recentes: proteção de 70 e poucos por cento, na população alvo é de quatro a 60 anos. Já tem vacina na rede privada. Mas sempre se sugere que seja mediante prescrição médica. Não planejamos essa compra uma vez que o Ministério da Saúde está com essa programação - disse.
Diante da insistência das entrevistadoras, a secretária afirmou:
- Nós nunca dizemos não. Isso (a compra) está em avaliação. Mas isso tem um custo, temos de ter previsão orçamentária. Vacina é de responsabilidade do Ministério da Saúde.
A situação é diferente da pandemia de covid-19: no caso do coronavírus, primeiro não havia vacina, depois, vários laboratórios se empenhavam em "fabricar" o imunizante. Na sequência, quando a vacina foi descoberta, havia vários produtos à disposição.
No caso da dengue, por enquanto, apenas um laboratório, o japonês Takeda, desenvolveu uma vacina, a Qdenga. No auge da crise da covid-19, o governo federal demorou para adquirir lotes, e o presidente Jair Bolsonaro deu declarações contrárias ao imunizante. No governo atual, não há sinais de demora. O que há é limitação da capacidade de produção por parte do Takeda.
A coluna não se convenceu com a resposta da secretária e voltou a questionar o governo estadual nesta quarta-feira (7).
Ouviu que o RS até poderia ter tentado adquirir o produto, mas que a prioridade do laboratório Takeda é a distribuição para o Ministério da Saúde, que, por sua vez, tem enfrentado dificuldade para adquirir lotes maiores. A pasta recebeu a primeira remessa com apenas 750 mil doses distribuídas em janeiro. O segundo carregamento, com 570 mil doses, deve ser entregue este mês. A responsabilidade por imunizantes, reforçou a secretaria, é do governo federal.
Agora, a coluna avalia: mesmo que quisesse, o Estado não conseguiria comprar mais a vacina. Ao menos, por enquanto. Na segunda-feira (5), o Takeda emitiu comunicado informando a decisão de priorizar o atendimento aos pedidos do ministério no fornecimento e suspendeu a assinatura de contratos diretos com Estados e municípios.