Dois dias na elegante Bruxelas são pouco tempo para se discutir uma relação que esfriou em oito anos, desde a última vez em que os chefes de Estado e de governo de 60 países da União Europeia (UE) e da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) se reuniram. Nesse período, o dragão chinês foi abocanhando, silenciosamente, o naco de terra abaixo do Rio Grande em termos de influência econômica e política. Só em 2022, o país do Oriente somou entre US$ 7 bilhões e 10 bilhões na América Latina (mais de US$ 130 bilhões em 20 anos).
É difícil competir. Mas os europeus revolveram tentar brecar o apetite chinês. O anúncio da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, nesta segunda-feira (17), de um investimento de 45 bilhões de euros (R$ 242 bi) é parte dessa tática de contenção.
A UE quer fortalecer o vínculo com a região como um todo, onde foi perdendo espaço até se tornar a terceira parceira comercial (depois de China e Estados Unidos). "No contexto global atual, com a ordem internacional baseada em regras e a democracia sob pressão, essa ligação adquire um significado geopolítico ainda maior", apontou um documento preparatório para a reunião desta segunda (17) e terça-feira (18) na Bélgica.
Foram preciso uma pandemia de covid-19 e uma guerra na Ucrânia para que a Europa acordasse para sua dependência estratégica de Rússia e China. É necessário abrir novos caminhos, além de cuidar dos velhos parceiros.
Enquanto isso, o dragão vai expandindo influência com seu soft power, o famoso "poder suave", aquele que não depende da força militar. Na América Latina e Caribe, já são 21 países integrantes da Belt and Road Initiative, o megaprojeto de infraestrutura também chamado de Nova Rota da Seda. No continente africano, são 44. É quase impossível encontrar uma grande obra de infraestrutura, de rodovias a barragens, por lá que não tenha dinheiro chinês. Por aqui, não é muito diferente. É difícil resistir ao sopro do dragão: que o diga o Uruguai, que gostaria de fechar um acordo comercial com a China à margem do Mercosul, o que implodiria o bloco. Ou a Argentina, que aderiu à Nova Rota da Seda, como uma porta alternativa ao FMI e ao Consenso de Washington.
Não será apenas por meio de cooperação econômica que os europeus virarão o jogo. Aliás, é possível até que tenham perdido o timing. Segundo o jornal Financial Times, em editorial, a UE chegou tarde à América Latina. Para reverter as previsões pessimistas, o bloco planeja investir em uma agenda mais ampla, para promover, por exemplo, desenvolvimento sustentável e cooperação tecnológica. Isso explica em parte porque, em visita ao Brasil, Von der Leyen havia anunciado 2 bi de euros em hidrogênio verde.