Reconhecido até por adversários como um negociador nato, Luiz Inácio Lula da Silva tem feito falta em Brasília em um momento decisivo das articulações para a aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) da transição no Congresso.
A ausência do presidente eleito, que só esteve na capital federal uma vez desde o segundo turno, é sentida por correligionários, que enfrentam dificuldade de interlocução especialmente no Senado. Até integrantes da base do atual governo, de partidos como PL, PP e Republicanos, esperam um aceno de Lula.
O presidente eleito viajou ao Egito para participar da COP27 e depois esteve em Portugal. Sua volta a Brasília era esperada para o início desta semana, mas ele precisou ser submetido a uma cirurgia nas cordas vocais devido a uma lesão benigna.
Mesmo com a recomendação dos médicos de que evitasse discursar, o presidente eleito pretendia viajar à capital na terça-feira (22). Depois, a expectativa ficou para quarta (23) e, agora, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), QG da transição, aliados já não arriscam nova data. Lula deve ficar em São Paulo, em recuperação, até a semana que vem.
Integrantes da transição admitem que sua presença na capital não seria apenas importante para as negociações, que são difusas no Congresso, mas também como gesto simbólico. A aprovação da PEC é fundamental para o futuro governo cumprir suas promessas de campanha, principalmente junto a sua base eleitoral, os mais pobres. A avaliação é de que o trabalho de formiguinha junto a parlamentares, por meio de uma frente liderada pelo ex-governador do Piauí Wellington Dias (PT), não tem destravado o nó: o prazo de vigência para a retirada do Bolsa Família do teto de gastos.
A licença é muito mais do que um "probleminha", termo utilizado pela presidente nacional do PT, Gleisy Hoffmann (RN), ao se referir ao entrave no Congresso. Sem Lula, há ainda desconfiança se os líderes à frente da articulação até agora têm caneta para garantir compromissos futuros em nome do futuro governo, já que nenhum ministro foi anunciado.
A falta do presidente eleito na capital também impacta na divulgação dos nomes para os grupos técnicos da Defesa e Inteligência, cujo anúncio tem sido postergado a cada dia. Há um claro desejo de que Lula esteja presente quando seus integrantes forem anunciados, dada a sensibilidade do tema — nesta quarta-feira, o senador eleito Flávio Dino (PSB-MA) deu nova data para a revelação: "Amanhã (esta quinta-feira, 24) ou no máximo sexta (25)".
Ao responder a uma pergunta sobre a formatação dos ministérios — se haverá divisão entre Justiça e Segurança Pública, entre Mulher e Direitos Humanos ou a recriação da pasta do Esporte, Dino afirmou:
— Quem escala o time é o técnico.
O problema é que o técnico está no departamento médico.