Em seu último discurso do atual mandato, na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, o presidente Jair Bolsonaro (PL) aproveitou o mais importante palco internacional para relatar feitos de seu governo, exibir suas propostas em caso de reeleição e atacar, ainda que sem citar explicitamente, o principal rival nas pesquisas, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A primeira parte do pronunciamento foi praticamente um resumo de seu programa de governo - que mistura trechos em que defende ações ao longo dos quatro anos de mandato com propostas de continuidade. Ao falar sobre a saúde e a pandemia de coronavírus, ao contrário de ocasiões anteriores, o presidente evitou citar tratamentos e medicamentos sem comprovação científica. Voltou a dizer, entretanto, que seu governo "não poupou esforços para salvar vidas e preservar empregos". Destacou que o auxílio emergencial beneficiou mais de 68 milhões de pessoas e, ao contrário do discurso de 2021, quando fez um pronunciamento contra a obrigatoriedade da vacina, desta vez, vendeu a imagem de um Brasil campeão na imunização, "com produção própria".
- Todos foram vacinados de forma voluntária - afirmou.
Em campanha e a 12 dias do primeiro turno, Bolsonaro deu detalhes de sua agenda doméstica, ainda que possa se questionar o quanto alguns aspectos internos interessavam à plateia internacional. Seu foco era o eleitor brasileiro, o que ficou claro, por exemplo, no momento em que citou a transposição do Rio São Francisco, "levando água para o Nordeste brasileiro". Nas pesquisas, nessa região Bolsonaro tem os piores índices de aprovação em relação a Lula.
Ao falar de economia, a figura do candidato se sobressaiu, mais uma vez, sobre a do presidente, com ataques aos mandatos do PT.
- Extirpamos a corrupção sistêmica que existia no país - afirmou, ignorando as diversas acusações contra seu governo, como a liberação de verbas no Ministério da Educação e de suspeitas que envolvem sua família.
Ele afirmou que, entre 2003 e 2015, "o endividamento da Petrobras, por má gestão, loteamento político e desvios, chegou a casa dos US$ 170 bilhões".
- O responsável por isso foi condenado em três instâncias por unanimidade - afirmou, referindo-se a Lula, mas sem citá-lo nominalmente.
Na segunda parte do discurso, Bolsonaro tentou mostrar ao mundo que o Brasil estaria saindo mais rápido da crise internacional. Mesmo ao falar de temas globais, como a guerra, voltou a ter como alvo o público interno, os eleitores, destacando a queda nos preços dos combustíveis e da energia elétrica
Pontos mais polêmicos e observados com lupa pela comunidade internacional, o ambiente e a proteção da floresta Amazônica ficaram para o final do pronunciamento. Bolsonaro repetiu argumentos que contrariam as imagens de queimadas e os dados de desmatamento no país, que ele atribui "à mídia nacional e internacional". Apresentou números gerais, ao dizer que dois terços do território brasileiro se encontram com vegetação nativa e que 80% da Amazônia "continua intocada".
Menos agressivo do que em discursos anteriores na ONU, Bolsonaro buscou, ao final, dedicar-se a temas das relações exteriores, defendendo um "cessar-fogo imediato" na guerra da Ucrânia e, sem citar a Rússia, fez um aceno ao governo de Vladimir Putin criticando "o isolamento diplomático e econômico":
- Não acreditamos que o melhor caminho seja a adoção de sanções unilaterais e seletivas.
Ao citar a defesa da liberdade religiosa, anunciou que o Brasil abre suas portas para acolher padres e freiras "perseguidos do regime ditatorial da Nicarágua". O presidente, no entanto, não citou outras ditaduras de esquerda, como Venezuela (embora tenha falado sobre os refugiados recebidos pelo Brasil na Operação Acolhida) e Cuba, ou de direita, em países do Golfo Pérsico, como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, que visitou durante o seu mandato.
Ele encerrou o discurso com o lema de uma nação que "acredita em Deus, pátria, família e liberdade", praticamente o de sua campanha, garantindo o mesmo tom eleitoral da maior parte do tempo que ocupou o púlpito internacional.
