Uma das tantas reflexões sobre a nova ordem global que irá surgir no pós-pandemia é o tamanho do Estado, que reocupou como agente organizador das relações sociais, políticas e econômicas o protagonismo na resposta à crise em que o mundo mergulhou devido ao coronavírus.
O presidente americano, Joe Biden, em seu discurso diante das duas casas do Congresso, na quarta-feira (28), encarnou essa ressurreição com palavras e ações. Nas frases, afirmou que é hora de as empresas e os bilionários financiarem programas sociais - cerca de 20 milhões de americanos perderam empregos durante a pandemia, enquanto 650 bilionários viram patrimônio subir em US$ 1 trilhão, afirmou. Nos gestos, reforçou os argumentos de seus planos de reforma do Estado, em especial o mais novo, um pacote de US$ 1,8 trilhão para ampliar o acesso dos americanos à educação e à saúde.
A inspiração é clara em Franklin Delano Roosevelt, o presidente democrata que governou os Estados Unidos em dois dos momentos mais traumáticos da história americana no século 20 - durante a Grande Depressão dos anos 1930 e na Segunda Guerra Mundial, até morrer em 1945.
A pandemia não é a mesma coisa que uma guerra, mas a extensão dos danos econômicos, especialmente em uma em rede interligada globalmente, está sendo encarada por Biden como um desafio semelhante à Grande Depressão.
Roosevelt, de quem o atual presidente tem um retrato de frente para a sua mesa no Salão Oval, assumiu o comando da nação quando o país enfrentava o auge da crise. Um quarto da força de trabalho americana estava desempregada. Os agricultores estavam em apuros, já que os preços de seus produtos haviam caído 60%, e a produção industrial havia despencado mais da metade desde o crash da bolsa de valores de Nova York, em 1929.
O então presidente implementou um programa de alívio, recuperação e reforma, esboço do que entrou para a História como New Deal (Novo Acordo). Tirou os EUA do buraco por meio de regulamentações e incentivos à cooperação. Criou instrumentos de controle estatal sobre os preços e a produção e elaborou amplos programas de seguridade social. Aumentou os impostos dos ricos, reduziu a jornada de trabalho e investiu em obras públicas, ajudando a criar milhões de novos empregos.
Biden segue esses passos: mais impostos para evitar a explosão da dívida pública, pretende subir as alíquotas sobre os lucros das empresas e impor mais taxas sobre os mais ricos.
- Wall Street não construiu o país. A classe média construiu o país - disse, diante do Congresso, na quarta-feira.
Pelos próximos oito anos, Biden pretende impulsionar a economia e amenizar os efeitos provocados pela pandemia com uma injeção de US$ 2 trilhões. O New Deal de Biden inclui reforçar a campanha de vacinação, distribuir cheques de US$ 1,4 mil para americanos prejudicados pelo fechamento do comércio e ajudar governos estaduais e locais com problemas de liquidez.
O risco de inflação está no horizonte. A oposição republicana começa a reclamar. E Biden, embora com maior popularidade do que Donald Trump e George W. Bush nos primeiros cem dias na Casa Branca, não tem o mesmo apoio dos americanos que Roosevelt possuía.