É verdade que os democratas estão fazendo de tudo para punir Donald Trump pela incitação à violência contra o Congresso. Mas, neste momento, o processo de impeachment não é uma boa para o presidente eleito Joe Biden, que assumirá na próxima quarta-feira (20).
Por vários motivos. O primeiro deles porque um eventual julgamento de Trump no Senado retira parte das atenções da mídia nacional e internacional de sua posse, ofusca suas promessas e primeiras ações, e joga o foco de volta sobre o Capitólio - e sobre um personagem político que, então, será passado.
Segundo porque Biden tem muito a fazer - e precisa do Congresso para aprovar algumas medidas imediatas. O impeachment no Senado pode entravar a pauta de votações.
Nesta quinta-feira (14), o presidente eleito apresentou um pacote para injetar US$ 1,9 trilhões (R$ 9,9 tri) na economia atingida pela pandemia. Biden planeja vacinar 100 milhões de americanos nos 100 primeiros dias de governo. É um desafio hercúleo. Um julgamento político de Trump atrasa a aprovação de um grande projeto de lei que coloca em ação, de forma rápida, sua agenda de curto prazo: auxiliar a economia e controlar o coronavírus. Até a confirmação dos nomes do secretariado (ministério), que, nos EUA precisa passar pelo Senado, ficaria comprometida.
Terceiro porque a continuidade do processo de impeachment mantém o país dividido – indo na contramão do discurso de união nacional que Biden tem feito. Na quarta-feira (13) à noite, após a aprovação do impeachment na Câmara, o democrata pediu ao Senado que conciliasse "o processo de impeachment" e o avanço de "assuntos urgentes da nação".
– Esta nação permanece sob a ameaça de um vírus mortal e uma economia vacilante – alertou, enquanto o país continua a bater recordes de mortes diárias por covid-19 e pode superar até sua posse os 400 mil mortos.
O futuro presidente também deixou transparecer sua preocupação em ver um Congresso monopolizado pelo julgamento de Trump por "incitamento à insurgência", relegando para segundo plano as audiências de confirmação de membros de seu governo, essenciais para permitir que passe rapidamente para a ação.
Ao fazer o discurso de reconciliação, Biden tem em mente os 75 milhões de votos que seu adversário recebeu na eleição de 3 de novembro. E, a despeito de uma minoria radical, o republicano, o segundo candidato mais votado da história americana, tem muitos eleitores fiéis. Biden precisa deles para manter a governabilidade.
Para o democrata, neste momento, talvez seja melhor deixar Trump seguir seu rumo e apenas permitir que a história se encarregue de julgá-lo – ou a Justiça, já que, a partir de quarta-feira (20), sem a imunidade do cargo, o então ex-presidente poderá enfrentar ações criminais e civis. A primeiro delas por fraudes bancárias e de seguros de seu grupo empresarial, processo que ficou parado na promotoria de Manhattan por quatro anos.