Nossos vizinhos de América Latina, México, Chile e Costa Rica já estão vacinando suas populações contra o coronavírus desde quinta-feira, 24, véspera de Natal. A Argentina deve começar na semana que vem. Equador inicia em janeiro. Colômbia, em fevereiro. E até a carcomida Venezuela tem uma previsão: abril.
O que há em comum entre esses países em termos políticos?
Quase nada. São governos à direita, como o Chile e a Colômbia, e à esquerda, como o México, a Argentina e a Venezuela. Alguns, como o Equador, viveram o colapso das UTIs e cenas dantescas de corpos pelas calçadas, porque não havia mais serviço funerário suficiente para enterrar as vítimas da covid-19. Outros, ascendem hoje ao topo do macabro ranking de óbitos, como o México, que está atrás apenas de Estados Unidos, Índia e Brasil.
Na desigual América Latina que começa a vacinar, há nações menos pobres, como o Chile, e outras esfaceladas economicamente, como a Venezuela.
Esse cenário de colcha de retalhos, de diferentes realidades, por incrível que pareça traz semelhanças, entretanto, que garantiram que suas populações tenham uma perspectiva de vacinação, passando a nós, brasileiros, a sensação de que nosso presente de Natal não veio. De que começamos a ficar para trás.
Os vizinhos do Brasil apostaram em pragmatismo – negociaram compra de diferentes laboratórios e países, não ficando dependente de apenas uma aposta. O Chile, que largou na frente na América do Sul, por exemplo, recebeu 10 milhões de doses da Pfizer/BioNTech, mas tem contratos com a Oxford/AstraZeneca, acordo com a Sinovac, que produz a Coronavac (chinesa), e faz parte do projeto Covax, da Organização Mundial da Saúde (OMS). A Argentina iniciará a campanha com o imunizante russo, o Sputnik V, mas também comprará doses da Pfizer/BioNTech.
A segunda lição é de gestão. Enquanto o Brasil não tem uma data oficial para o começo da campanha de vacinação, esses governos apresentaram cronogramas claros com prazos e metas de cobertura vacinal. Pegue-se o Equador como exemplo: o país terá 400 centros de distribuição, como postos de saúde na zona rural e outros centros dispostos em farmácias e universidades. A distribuição das primeiras 50 mil doses da Pfizer/BioNtech começará por idosos em abrigos e profissionais de saúde.
A terceira lição é que, nessas nações, embora haja disputas entre situação e oposição – o Chile está inclusive em meio a um processo da escolha da Comissão Constituinte que irá escrever a nova Constituição e a um ano de eleição presidencial –, a busca pela vacina é questão urgente e não foi politizada – no Brasil, não apenas o presidente Jair Bolsonaro trabalha contra a vacina como parte da sociedade vai na onda negacionista do governo, se recusando a tomar qualquer imunização.
Os governantes que começaram a vacinar a população o fazem não apenas porque são "bonzinhos" ou bastiões de humanidade – definitivamente, não (leia-se Nicolás Maduro). Mas aceleraram os processos porque sabem que uma população imunizada lhes dará capital político. Serão os primeiros países a sair da crise sanitária e econômica. Podem até pensar em se reeleger. Sem previsão oficial de início da campanha, o Brasil está no fim da fila no continente, ao lado de Nicarágua, Uruguai e Peru. Na América Latina, morreram até agora 490 mil latino-americanos e 14,9 milhões foram infectados.