Atrás nas pesquisas de intenção de voto nacionais e na maioria dos Estados-chave da eleição, o presidente Donald Trump sairá perdendo ao não participar do segundo debate, previsto para o dia 15.
Pouco depois de o republicano conceder uma entrevista à rede Fox News, ainda sob o efeito da decisão da comissão de debates presidenciais de realizar o próximo duelo de forma virtual, por razões sanitárias (Trump tem covid-19), a campanha divulgou uma nota oficial para a imprensa confirmando que ele não participará do encontro.
Assinada pelo chefe de campanha de Trump, Bill Stepien, a nota segue a narrativa criada pelo presidente: considerar a decisão da comissão unilateral, supostamente com o objetivo de favorecer o rival democrata, Joe Biden.
- O presidente Trump ganhou o primeiro debate, apesar do terrível e tendencioso moderador Chris Wallace, e todo mundo sabe disso - disse Stepien.
Eis aí um case perfeito a ser estudado dos famosos "fatos alternativos" da era Trump na Casa Branca: distorcer a realidade para adaptá-la a sua narrativa. O moderador, de fato, não foi bem na condução do debate do dia 29 de setembro, mas daí a acusá-lo de tendencioso significa flexibilizar os fatos para adaptá-los a seus interesses. Ainda mais em se tratando de um profissional da Fox News, emissora de TV alinhada ideologicamente aos republicanos e que, nos quatro anos de mandato, Trump privilegiou, concedendo entrevistas exclusivas, enquanto as negava para outros veículos de informação, críticos do governo.
Desqualificar a comissão de debates se alinha também à narrativa de deslegitimar o processo eleitoral americano - algo que Trump já faz com a questão dos votos pelo correio e ao não se comprometer em aceitar o resultado da eleição, no dia 3 de novembro - Mike Pence, o vice, também se negou a fazer isso no debate de quarta-feira (7).
Trump perde ao não ir ao debate virtual por vários fatores. O primeiro é que deixa de aparecer diante de uma multidão de eleitores que talvez só a televisão tenha capacidade de amalgamar. O primeiro encontro foi assistido por 73 milhões de pessoas.
Segundo porque, estando atrás nas pesquisas, ele perde a oportunidade de aparecer diante dos eleitores, defender seu mandato e vangloriar-se de supostamente estar vencendo a covid-19 - algo de que, vaidoso, gosta de fazer. Candidatos que têm ampla vantagem nas pesquisas de opinião a menos de quatro semanas para a eleição costumam fugir do debate. Não os que estão atrás.
Terceiro porque o duelo, mesmo com os candidatos distantes entre si, terá como sede a Flórida. O formato consiste em perguntas feitas por eleitores comuns. O Estado é um dos principais campos de batalha da eleição - senão for o principal. Nenhum político costuma chegar à Casa Branca sem vencer lá. Ganhar na Flórida significa levar os 29 delegados a que o Estado tem direito no colégio eleitoral, rumo ao número mágico dos 270 (entre 538) para vencer. Várias pesquisas publicadas na quarta-feira (7) mostram Biden na frente no Estado. Reuters/Ipsos dá ao democrata quatro pontos percentuais a mais do que Trump - na última, há uma semana, os dois apareciam tecnicamente empatados. No levantamento da Universidade Quinnipiac, a vantagem é maior: 11 pontos a mais para Biden no Estado.
Pesquisa é retrato do momento. E, até por isso, diante de um quadro de alerta nas fileiras republicanas, a decisão de Trump foi errada.