Dois incidentes envolvendo fronteiras despertaram atenção internacional nesta terça-feira (16). Distantes entre si e por razões diferentes, ações militares provocaram apreensão, sobretudo por se tratarem ou de potências que já viveram guerras anteriores ou porque são munidas de arsenais nucleares.
Índia x China
O fato: pelo menos 20 soldados indianos foram mortos durante confronto com militares chineses no vale do rio Ladakh, no Himalaia. Segundo a imprensa indiana, um coronel estaria entre as vítimas e pelo menos 34 soldados estariam desaparecidos. Fato curioso: duas potências atômicas se atacaram mutuamente em confronto com barras de ferro e pedras. Foi o primeiro incidente com mortes na fronteira entre os dois países em 45 anos.
O pano de fundo: a Índia acusou a China de “mudar unilateralmente o status quo da região. A China acusa os soldados indianos de terem cruzado duas vezes a fronteira entre os dois países. Na verdade, as duas nações disputam o território, que fica em um ponto estratégico entre o Tibete e a Cachemira - esta última também disputada entre a Índia e o Paquistão. Trata-se de uma área de 90 mil quilômetros quadrados no oeste do Himalaia e outros 38 mil quilômetros quadrados no Leste. Desde maio, os chineses enviaram tropas para locais estratégicos, e a tensão se intensificou. Houve confrontos em 1967 e 1987, mas o cenário mantinha-se pacífico nas últimas décadas graças a tratados entre China e Índia. A China, potência hegemônica na região, observa com preocupação a aliança estratégica da Índia, do presidente Narendra Modi, com os Estados Unidos, de Donald Trump.
No ano passado, o presidente americano foi recebido em um estádio de beisebol no país, mostra do apreço do governo indiano, com quem mantém um acordo para venda de armas. O apoio dos Estados Unidos é também uma forma de tentar equilibrar o poder chinês na região.
Coreia do Norte x Coreia do Sul
O fato: a Coreia do Norte explodiu nesta terça-feira (16) um prédio que funcionava como escritório de ligação com o governo da Coreia do Sul, na cidade de Kaesong, fronteira entre os dois países. Trabalhavam na edificação 20 funcionários de cada um dos governos.
O pano de fundo: esse segundo episódio é mais simbólico do que o que envolve China e Índia. O escritório de ligação, construído em 2018, era a concretização das intenções dos dois governos de reduzir as tensões. Estava fechado desde janeiro em razão da pandemia. O estopim, aparentemente, da decisão norte-coreana de explodir o prédio é sua irritação com desertores do regime que, durante anos, têm lançado panfletos fazendo críticas contra o Norte. Os papéis são lançados com balões na direção do território norte-coreano. Mas, em um segundo nível de análise, pode-se perceber que o regime comunista está escalonando o discurso agressivo contra o Sul. O Norte abandonou um acordo de redução da tensão em 2018, quando houve um encontro histórico entre o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente americano, Donald Trump.
O compromisso com o desmonte do programa nuclear norte-coreano foi assinado, mas não houve avanço desde que as novas conversações fracassaram, no Vietnã. A Coreia do Norte promete acabar com seu arsenal atômico, uma vez que os EUA levantem sanções econômicas ao país. Já os EUA querem que primeiro ocorra o desmantelamento dos complexos nucleares. Coreia do Norte e Coreia do Sul travaram uma guerra entre 1950 e 1953, ainda tecnicamente existente, uma vez que nenhum acordo formal de paz foi selado - apenas um armistício.
No fundo, há uma situação de desconfiança em curso, mas também há uma disputa de poder em curso que liga a tensão na Península Coreana com a rixa no Himalaia: briga influência geopolítica entre os EUA, aliados da Coreia do Sul, e a China, tutora da ditadura comunista. Pequim mantém sua influência na região por meio do apoio a Kim, em oposição à presença americana, por meio de aliados como Coreia do Sul, Taiwan (uma província rebelde para a China) e Japão.