Não é de hoje que grupos de mídia e jornalistas independentes são considerados inimigos pelo governo da Venezuela. A exemplo de Hugo Chávez, seu antecessor, Nicolás Maduro costuma acusar a imprensa – nacional e internacional – de criar um clima de tensão, em uma suposta "guerra midiática" para provocar um golpe de Estado contra seu regime.
Na atual crise, desde 23 de janeiro, pelo menos 10 jornalistas sofreram agressões, ataques ou tiveram seus equipamentos apreendidos durante a cobertura, a exemplo do que ocorreu com o repórter Rodrigo Lopes, de Zero Hora. O dado foi divulgado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH): "Jornalistas e meios independentes denunciaram que não puderam dar cobertura plena a protestos por medo de serem fechados", informou, pelo Twitter, Edison Lanza, relator especial para a liberdade de expressão da entidade.
Jornalistas internacionais em Caracas, entre eles brasileiros, têm evitado participar de pronunciamentos do governo no Palácio Miraflores, porque, segundo afirmam, é uma forma de as forças de Maduro identificarem os profissionais estrangeiros que estão no país".
Depois de duas décadas de governos chavista e madurista, não há, fora da internet, veículos de comunicação independentes no país. O último, o jornal El Nacional, com 75 anos de história, deixou de circular em versão impressa em dezembro. O diário sofreu ações sistemáticas de intimidação de repórteres e editores, além de ataques por meio de ações judiciais e restrições publicitárias e de acesso a papel imprensa, que culminaram na asfixia do veículo.
– Foram 15 anos de assédio – disse Miguel Henrique Otero, CEO do El Nacional, que vive em autoexílio entre os Estados Unidos e a Europa.
Outros jornais, como El Universal e Últimas Notícias, também sofreram crises de fornecimento de papel e pressões econômicas que culminaram na venda para grupos ligados ao governo. Observatórios de imprensa alertam que a liberdade dos meios de comunicação sofreu ainda maior retrocesso em 2018, depois da reeleição de Maduro – cercada de denúncias de fraude. Segundo a ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF), a Venezuela caiu seis posições no índice de liberdade: passou da 137ª para a 143ª posição entre 180 nações (o Brasil subiu um lugar, de 103º para 102º). A entidade cita prisões arbitrárias de jornalistas, expulsão de repórteres estrangeiros e processos de difamação.
No caso de rádios e TVs, interdições têm deixado a cobertura jornalística cada vez mais nas mãos dos veículos estatais. Esses veículos cobrem a agenda oficial de Maduro, ignorando a falência econômica do país e os problemas do dia a dia da população, como falta de comida e remédios.
A emissora de TV Globovisión, crítica ao chavismo, foi vendida a um empresário que, segundo opositores, teria ligação com o governo. Um dos primeiros alvos da ofensiva de Chávez foi a RCTV, a mais antiga emissora do país. Ela não teve sua concessão renovada em 2007.
A "guerra midiática", como afirmava Chávez, começara no golpe de abril de 2002 – que o afastou do poder por 48 horas. Ele acusava canais privados de exibirem desenhos e de não terem noticiado as manifestações populares que pediam seu retorno. Em 2004, Chávez, de volta ao poder, criou a Lei de Responsabilidade Social no Rádio e Televisão, batizada de "Lei da Mordaça" pela oposição.