Após 13 anos, o Brasil encerrará até 15 de outubro a missão no Haiti. Na quinta-feira, o Conselho de Segurança das Nações Unidas ordenou a substituição da Minustah (Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti) por uma tropa de caráter policial. O processo de retirada brasileira já era gestado havia meses pelo Ministério da Defesa. A não renovação do mandado da ONU apenas oficializa uma vontade antiga do governo, que enfrentava o dilema de como sair, sem dar a impressão de que abandonou o barco que comanda.
Ainda que não seja um fim honroso – o Haiti não consegue andar com as próprias pernas, como seria o sonho da comunidade internacional –, o Brasil fecha um capítulo importante de sua política externa do ponto de vista de projeção de poder. A Minustah foi implementada em 2004 após a deposição do presidente haitiano Jean-Bertrand Aristide. Com a intenção de obter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, o Brasil da era Lula comandou desde o princípio a missão. Embora tivesse experiência em operações de paz anteriores, no Sinai, em Angola, Moçambique e Timor Leste, entre outros países, foi no Haiti que nossos capacetes-azuis enfrentaram sua mais difícil empreitada em terras estrangeiras. O Brasil pegou um Estado falido, imerso na miséria e em pré-guerra civil.
Apesar dos percalços de uma missão cara – o país gastou mais de R$ 2 bilhões no Haiti, o que gerou críticas de quem achava que o Brasil deveria gastar esse dinheiro aqui e não lá –, a lógica fazia sentido à época. Ser player da política internacional exige gastos e tomada de decisão. Marcou posição.O outro ganho foi militar. Até outubro, o Brasil terá enviado cerca de 37,5 mil militares ao Haiti. Os dois últimos contingentes em 2017 perfazem 1.940 militares. Disponibilizar tropas para missões da ONU é a melhor forma de manter azeitada a máquina militar de uma nação em tempos de paz. No país caribenho, o Exército aprendeu várias lições: experienciou a primeira grande batalha desde a II Guerra Mundial, a tomada de Cité Soleil, contribuiu para a reconstrução da nação e vivenciou sua maior tragédia no Exterior, o terremoto que matou 300 mil pessoas, entre elas 17 militares. A experiência no Haiti deu às tropas brasileiras know-how para atuar em guerra urbana, que acabou sendo fundamental para atuações contra o tráfico, por exemplo.
O fim da missão não isenta o Brasil de seu compromisso com milhares de haitianos que vieram para cá em busca de uma vida melhor. Além de ganhos militares e diplomáticos, os 13 anos selaram, sobretudo, a união entre duas nações que pouco se conheciam e que, hoje, podem ser consideradas irmãs.