O Iêmen, país que teria recebido as armas exportadas pela empresa brasileira Forjas Taurus, segundo documentos em posse do Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul e revelados em primeira mão pela agência de notícias Reuters, abriga uma das células mais mortíferas da rede terrorista Al-Qaeda. Nesse minúsculo país da Península Arábica, estrategicamente localizado entre o Golfo de Áden e o Mar Vermelho, com 24 milhões de habitantes, a rede outrora comandada por Osama bin Laden que entrou em decadência após a decapitação da cúpula da organização no Afeganistão e no Paquistão, encontrou refúgio. Trata-se de um poderoso ramo da Al-Qaeda chamado Al-Qaeda na Península Arábica.
O Iêmen é um antigo conhecido dos serviços de inteligência, embora não tenha figurado com devida atenção no noticiário internacional – mais voltado, em geral, para os conflitos no Iraque e na Síria. Silenciosamente, a guerra civil no Iêmen tem atentados tão mortíferos quanto os de Bagdá – no dia 29 de agosto, um carro-bomba matou mais de 70 pessoas em um centro de recrutamento de soldados em Áden. Os combates também produziram cenas dantescas de refugiados em fuga tanto quanto as vítimas da Síria – há 3 milhões de pessoas deslocadas internamente e 200 mil foram buscar refúgio no Exterior. Também lá escolas são alvos quase mensais de bombardeios: no dia 14 do mês passado, pelo menos 10 crianças morreram e 28 ficaram feridas em um ataque na província de Saada. Em 18 meses de conflito, 10 mil pessoas morreram, segundo a ONU.
O país convive com o terrorismo muito antes de o mundo descobrir quem era Osama bin Laden. Foi no porto de Áden que, em outubro de 2000, 11 meses antes dos atentados às torres-gêmeas de Nova York, um ataque contra o destróier americano USS Cole matou 17 marinheiros e deixou como imagem um rombo no casco da embarcação dos EUA. Como em toda nação onde o governo se liquefaz, o terrorismo encontra terreno fértil.
O Iêmen viveu os ventos da Primavera Árabe, em 2011, mas, ao contrário de Líbia e Egito, seu ditador não foi preso ou morto – Ali Abdullah Saleh fugiu do país, após 32 anos de governo. Hoje, a nação vive uma situação muito parecida com a Somália - território aos frangalhos, instituições carcomidas pela corrupção e disputa de poder, uma nação sem poder central.
Desde 2014, os huthis, rebeldes xiitas procedentes do Norte, e o governo do presidente Abd Rabo Mansur Hadi, se enfrentam. As forças que apoiam o presidente fugiram da capital, Sana, e se reagruparam no Sul. São quase diários os ataques dos EUA e da Arábia Saudita (apoiadores do presidente) com o uso de drones no Iêmen – contra os terroristas e contra as tropas rebeldes. Aproveitando o caos gerado pelo conflito, os extremistas da Al-Qaeda e seus rivais do grupo Estado Islâmico reforçaram sua influência.
Nesse contexto caótico surge a figura de Fares Mohammed Mana’a, ex-aliado da ditadura de Saleh e hoje um dos maiores traficantes de armas do mundo, segundo as Nações Unidas. Ele lidera os rebeldes huthis na região de Sadah. Mas seus negócios vão além das fronteiras do Iêmen – suas armas, compradas no mercado ilegal, abastecem inclusive o grupo Al-Shabah, braço da Al-Qaeda na Somália e tão cruel quanto o Estado Islâmico.