Vamos começar pela obviedade: minha liberdade acaba quando começa a sua. Qualquer sistema jurídico-democrático se baseia nisso. Ou seja, todo direito individual pode – e deve – ser contestado quando impõe prejuízo a terceiros. Não seria diferente com o direito à propriedade.
No caso do Estádio Olímpico, por exemplo, temos um conjunto escandaloso de prejuízos a terceiros. A antiga sede do Grêmio, caindo aos pedaços no bairro Medianeira, não é apenas um desrespeito à memória da cidade, mas uma verdadeira desgraça para a comunidade da região.
Existem ali problemas sanitários, com proliferação de insetos, problemas de segurança, com furtos em todo o entorno, problemas estruturais, com risco de desmoronamentos, problemas econômicos, com imóveis desvalorizados, problemas sociais, com concentração de moradores de rua, problemas de poluição visual, problemas urbanísticos, problemas ambientais etc etc etc.
Dito isso, o prefeito Sebastião Melo tem, sim, toda a base jurídica para desapropriar o Estádio Olímpico. Ele mesmo já acenou com essa possibilidade, no mês passado, ao dar um ultimato no Grêmio e na Meta, construtora que um dia se chamou OAS. Advogado especialista em direito patrimonial, Bruno Martins da Costa Silva faz a seguinte avaliação:
– Considerados os danos à coletividade e a falta de perspectiva de solução, não vejo qualquer impedimento para um pedido de desapropriação. Nossa Constituição prevê a função social da propriedade, ou seja, o uso do imóvel deve atender minimamente ao interesse coletivo, jamais ser fonte de prejuízo aos demais.
A degradação do Olímpico, ícone de Porto Alegre que hoje agoniza em praça pública, é um espetáculo inaceitável de irresponsabilidade social.
Quer dizer: o direito de ser proprietário de qualquer bem está associado ao dever de se responsabilizar por esse bem – e pelos efeitos que esse bem produz na sociedade. No caso do Olímpico, os efeitos têm sido perversos. Ainda mais quando lembramos que os clubes de futebol, assim como os clubes sociais, não pagam IPTU na Capital. Exatamente: aquela pocilga que já foi um lindo estádio, atualmente, não entrega nem retorno tributário ao município.
A degradação do Olímpico, um ícone de Porto Alegre que hoje agoniza em praça pública, virou um espetáculo inaceitável de irresponsabilidade social. Interromper esse abuso, que já dura quase uma década, é o mínimo que se espera de uma cidade que se dá ao respeito.