Porto Alegre deveria se envergonhar, mas, como se trata de um assunto considerado supérfluo, secundário, quase bobo, ninguém dá a mínima. Seria um escândalo em qualquer lugar minimamente civilizado, só que aqui, como se sabe, separação de lixo sempre foi uma questão irrelevante. Uma espécie de capricho politicamente correto.
Há condomínios no Moinhos de Vento, no Mont'Serrat e no Bom Fim – ou seja, em bairros habitados por gente, em tese, muito instruída – que até hoje enfiam o lixo todo num mesmo sacolão e pronto: mais prático assim.
Mas o fiasco da vez é que, na semana passada, o DMLU anunciou o fim dos contêineres de lixo reciclável. Eram 50 recipientes verdes espalhados pelas ruas do Centro Histórico desde 2018 – faziam parte de um projeto-piloto para melhorar os índices de reciclagem da Capital. Só que esses contêineres (repito, exclusivos para lixo reciclável) vinham recebendo tanto resíduo orgânico que, no fim das contas, não serviam para nada.
Foi assim desde o lançamento do projeto. Três anos atrás, quando os caminhões do DMLU foram fazer a primeira coleta nos novos contêineres, lembro que havia uma expectativa na prefeitura para saber a quantidade de resíduos que seriam aproveitados. Levaram tudo para as unidades de triagem e, quando foram avaliar o material, adivinha? Havia tanta matéria orgânica lambuzando o que poderia ser reciclado, que nada, nem um único grama em meio às sete toneladas recolhidas, pôde ser reutilizado.
A separação de lixo é um ótimo indicador para mensurar o grau de cidadania de uma população. Primeiro, pelo mais óbvio: quando as pessoas fazem a separação correta, temos menos imundície no mundo. Mas o segundo motivo é essencialmente solidário. Só em Porto Alegre, 600 famílias vivem da venda de material reciclável. Quer dizer: quanto mais resíduos em condições de serem reaproveitados chegarem às unidades de triagem, mais dinheiro esse pessoal ganha.
Nem tudo depende da gente para o país melhorar, mas muita coisa começa por nós. Separar o que presta do que não presta parece bem oportuno.
Portanto, quem descarta errado, quem não separa nada, quem joga o lixo orgânico em cima do seco, quem faz isso está deixando de gerar renda para famílias de baixa renda. É uma desumanidade – embora nem sempre seja por mal, claro, as pessoas não sabem disso. Mas é hora de saberem.
Porto Alegre poderia reaproveitar 260 toneladas de lixo reciclável por dia, mas, segundo o DMLU, esse número nunca passa de 65. Quatro vezes menos, porque as pessoas descartam errado. Não é à toa que todos os países desenvolvidos têm índices de reciclagem muito superiores aos nossos. Nem tudo depende da gente para o país melhorar, mas muita coisa começa por nós. Separar o que presta do que não presta parece bem oportuno.