Uma das grandes vergonhas de Porto Alegre é o tratamento que o poder público dispensa à população das ilhas. Todo ano é a mesma coisa: chove, as casas inundam e os moradores perdem tudo. Quase tudo, na verdade.
Mesmo sem roupa seca, com o queixo batendo de frio, muitos seguem dentro de casa para vigiar algum móvel que salvaram. Porque, se forem para um abrigo, ladrões vão invadir os casebres e levar qualquer coisa que tenha restado.
É humilhante. Os governos botam a culpa na burocracia – aquela é uma área de preservação ambiental, então precisam de estudos complexos para regularizar a situação. Mas veja que coisa: de um ano para cá, 500 famílias da região foram transferidas para dar lugar à construção da nova ponte do Guaíba. Até que foi rápido. Como se explica essa eficiência?
Não foi por motivação humanitária, claro que não. As pessoas foram retiradas de lá porque estavam atrapalhando a obra. Já as que continuam lá, como se sabe, não estão atrapalhando nada, então que aguentem a falta de dignidade pelo tempo que for.
– Mas muitos não querem sair! – é outro argumento comum.
Claro, eles são ribeirinhos. A cultura deles, a economia deles, a identidade deles, o modo de vida deles, tudo está à beira do rio. De certa forma, é como entrar em uma aldeia indígena e pedir para o índios saírem. Não adianta argumentar que "a cidade tem mais estrutura" – o mundo deles não é a cidade. E isso não pode servir de desculpa para o poder público se omitir.
No governo Rigotto, foi homologado o plano de manejo dos moradores das ilhas. Por se tratar de um parque estadual, os estudos ambientais seriam do Estado, mas as políticas de habitação caberiam à prefeitura. A ideia era que os nativos permanecessem na região, mas com adaptações que lhes dessem mínimas condições de vida.
Passaram-se 15 anos e, na prática, não avançou absolutamente nada. É uma vergonha. Uma das grandes vergonhas de Porto Alegre.