Entre os 20 projetos que o prefeito Marchezan enviará à Câmara nos próximos dias – que incluem socorro a famílias de baixa renda, avaliação semestral de estudantes e uma reforma da Previdência –, um deles já provoca discussões inflamadas. É o tal pedágio para os carros circularem na região central.
Aliás, uma primeira observação: ao propor algo tão impopular às vésperas da eleição, Marchezan mostra que o desejo de se reeleger não se sobrepõe às suas convicções – que podem ser contestadas, claro, mas há um mérito aqui.
Critiquei duramente a proposta anterior do prefeito, encaminhada à Câmara em janeiro, que agora foi alterada: naquele momento, a ideia era cobrar pedágio de todo carro emplacado fora de Porto Alegre que entrasse na cidade. Uma bizarrice. Capitais existem para ser globais, coletivas: elas cumprem um papel de ímã, de polo de atração, precisam acolher, aceitar, abraçar – e devem se organizar para receber, não para barrar.
Mas o novo projeto, que implementa um pedágio no Centro, não diferencia quem "é daqui" de quem "é de fora" (o que, por princípio, me soa sempre mal). Ele repete um modelo que já dá certo em centros urbanos onde o transporte público funciona bem. Londres, Singapura, Estocolmo, Nova York, todas elas cobram tarifas dos carros que acessam as áreas mais congestionadas da cidade.
Não é só uma forma de incentivar o uso do transporte coletivo, mas também de financiá-lo. É uma fonte de receita que será injetada em um sistema que, sozinho, não se sustenta mais. Aliás, em Porto Alegre, a forma como o sistema de transporte coletivo se sustentou nos últimos anos foi cruel. Porque foi com o dinheiro dos mais pobres.
Quem vive nos bairros mais centrais – que é a população com maior poder aquisitivo – deixou de andar de ônibus para andar de aplicativo. E aí o sistema começou a quebrar. Mas quem vive nas periferias, claro, não pode andar de aplicativo, porque uma corrida até a região central custa R$ 40. Não é justo que outros setores da sociedade ajudem a dividir essa conta?
Algumas questões ainda precisam ser respondidas, é verdade. Moradores do Centro, por exemplo, também pagariam pedágio? Não faria sentido. Agora é torcer para que a Câmara faça uma discussão madura. Discordar é saudável, mas não para soterrar o debate: é saudável para construir a melhor solução.