Você talvez já tenha ouvido essa máxima do liberalismo econômico: custos privados, lucros privados. Quer dizer: não venha o poder público meter a mão no que eu, sozinho, consegui transformar em receita. Se tirei do meu bolso para investir, é justo que os frutos sejam meus.
O que o Inter pretende fazer com seu plano de erguer dois espigões ao lado do Beira-Rio – um deles seria o maior do Rio Grande do Sul, com 130 metros de altura – é uma inversão escandalosa dessa lógica: custos públicos, lucros privados. Porque foi o município de Porto Alegre que doou aquela área, há 63 anos, exclusivamente para o clube construir uma "praça de esportes".
O tamanho das torres, o desrespeito ao Plano Diretor, o bloqueio do ar que vem do Guaíba, tudo isso poderia ser discutido. Eu aqui, honestamente, não tenho nada contra essas construções imensas em grandes centros urbanos. Desde que o investidor, claro, compre a área onde vai investir. Se ele ganha essa área – e ganha do poder público, que estabelece as condições para usá-la –, não pode, agora, sair faturando como bem entender.
Em resumo, os lucros serem privados quando os custos são privados, ok, nada mais justo. Mas, se os custos são públicos e os lucros são privados, isso não é capitalismo: é privilégio. Não há notícia de que algo semelhante já tenha ocorrido em Porto Alegre.
Imagine se a Casa do Menino Jesus de Praga, por exemplo, decidisse erguer um hotel e um prédio residencial no terreno onde fica sua sede – um espaço que, assim como a área do Beira-Rio, foi cedido pelo município para uma finalidade específica. Não teria cabimento.
O Inter – e o Grêmio, além de todos os clubes da cidade – já não paga IPTU e ainda usufrui de outros terrenos que um dia foram públicos. Como se não bastasse, quer vender o que ganhou. Era só o que faltava.