Quarta-feira, um dia antes do referendo que pode mudar alguns aspectos da vida na Grã-Bretanha e, principalmente, mudar radicalmente a relação da ilha com o continente vizinho, o clima era tenso. Para os padrões britânicos, a campanha pegou fogo. Está certo que foi no último dia, mas pegou. Foi a primeira vez que se viu gente panfletando em estações de metro, em escolas, nas ruas. Era só no que se falava. Nada comparado a um domingo anterior a uma eleição apertada no Brasil. Mas aqui, é difícil empolgar. E o mais preocupante, é difícil empolgar o jovem eleitor.
Por isso, mais do que usar a morte de Jo Cox como cabo eleitoral pela campanha da permanência na UE no ato realizado em sua homenagem na quarta, políticos e pensadores realmente interessados para onde este pedaço do velho mundo se move, seguem outra linha. A aposta é incensar a imagem de uma mulher forte, vigorosa, de ideais democráticos e que fazia a diferença aos seus próximos.
Deste referendo cheio de incertezas –as pesquisas apontam empate técnico, e mais cheia ainda de preconceito sobre imigração –, o que fica de positivo é a obrigação que temos de nos envolvermos para fazer a diferença. Independentemente do resultado.
Opositores reunidos
A campanha pela permanância na União Europeia coloca até mesmo oposicionistas lado a lado. Quarta-feira, o primeiro-ministro conservador David Cameron encontrou-se com a trabalhista Harriet Harman (D) no ônibus no qual viaja em campanha pelo "Sim" – eles estavam em Bristol, no sul do país. A fundadora de marca de bolsas Isabela Queen, Isabelle Ugochukwu (E), também participou da conversa.
Show de celebridades
Na Trafalgar Square, Jo Cox, a deputada trabalhista assassinada na quinta passada, ganhou uma homenagem com presenças ilustres, como a Nobel da Paz Malala Yousafzai, a cantora Lily Allen. Jo completaria 42 anos quarta-feira. Ela morava em um barco, perto da Torre de Londres, e foi assim que o marido e os dois filhos chegaram ao centro, navegando pelo Tâmisa.
Ajudando a decidir
Informar foi o maior desafio desta campanha. As livrarias se esforçaram. Uma das mais famosas apelou para a música do The Clash "Should I Stay or Should I Go" (Fico ou vou?) para atrair o eleitor para sua vitrine e apresentar a seleção de títulos.
Croissant da paz
Quem disse que franceses e ingleses não se bicam? Este referendo revelou manifestações simpáticas, mais do lado de lá do canal do que do lado de cá. Quem circulou na estação de King's Cross, ponto do Eurostar (trem que liga os dois países), ganhava bilhetinhos carinhosos e espirituosos de franceses. A ação #operationcroissant ainda incluía a guloseima. Mas pela legislação, acabaram doando as meias luas para os moradores de rua.
A "operação croissant" foi ideia de três amigos que, preocupados com um conhecido, ainda indeciso sobre o seu voto, resolveram sensibiliza-lo. Ele decidiu votar por ficar.
Famosos na campanha
Os famosos são escancaradamente a favor por ficar. A lista é grande com David Beckham, Benedict Cumberbatch, Ian McEwan e Jude Law. No Twitter, o primeiro-ministro David Cameron compartilhou uma foto do ator Daniel Craig, um dos 007, com a inscrição "Nenhum homem é uma ilha. Nenhum país por si só" na camiseta.
Cada um por sí
Uma grande maioria dos imigrantes de fora da Europa como indianos e africanos, segundo apontam algumas pesquisas, apoiam a saída da Comunidade Europeia. Eles se sentem ameaçados pelos imigrantes dos países europeus, nos seus empregos e benefícios.
Os finalmentes
Dia de eleição não é feriado no Reino Unido e toda a eleição é numa quinta-feira. Vota-se das 7h às 22h. Até 1998, a cédula só podia ser marcada com o lápis fornecido pela zona eleitoral. Hoje já se pode usar caneta. Num processo bem simples, as pessoas podem indicar um procurador para votar em seu lugar até quatro dias antes da votação.
Quem vota
Um dos dos pontos mais polêmicos deste referendo foi a lei especial que limitou os eleitores aptos a esta votação. Votam hoje cidadãos britânicos e cidadãos da antiga Comunidade Britânica, a configuração original, isso é Austrália, Nova Zelândia, Irlanda e Canadá. Diferentemente de outros referendos, não foi permitido o voto dos cidadãos europeus residentes na Grã Bretanha. E nem britânicos residentes fora do país que não votaram nas últimas eleições. A mudança beneficia a campanha pelo Brexit.
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Esta é a primeira vez que os membros da Casa dos Lordes podem votar numa eleição. A moral é que se você é Nobre, pra que iria votar num Comum?
Chuva e vento
O voto por aqui não é obrigatório e a previsão do tempo influencia e muito na abstenção. A previsão é de tempo instável e muita chuva no Sul. Historicamente, o eleitor mais jovem não comparece e é justamente ele uma das apostas da campanha por ficar na comunidade.