Pelas circunstâncias da independência do Brasil, historiadores em geral e brasileiros de todos os quadrantes torcem o nariz quando Dom Pedro I é citado entre os libertadores da América que lutaram bravamente pela emancipação dos povos sul-americanos colonizados e explorados por europeus. Na verdade, o príncipe português só desembainhou a sua espada (depois da célebre dor de barriga) na pintura de Pedro Américo, que imaginou um épico Grito do Ipiranga para agradar o contratante da obra, o imperador Dom Pedro II, pai do indigitado. Só mesmo em Portugal, para retomar o poder usurpado por seu irmão, é que ele foi lutar de verdade, como fizeram por aqui os incontestáveis Simón Bolívar e San Martin.
Mas o Brasil teve o seu libertador da América – e ele era gaúcho, embora tenha nascido além de nossas atuais fronteiras. Refiro-me a Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça, que nasceu em 1774 em Colônia do Sacramento no tempo em que a atual cidade uruguaia era dominada pelo império português. Quem batalha para colocá-lo no panteão dos heróis sul-americanos não sou eu, que seria duplamente suspeito por ser conterrâneo e jornalista. Essa cruzada está sendo empreendida por um peruano radicado no Rio Grande do Sul, o professor Roberto Revoredo Castro, autor do livro Hipólito José da Costa e a Independência da América Latina.
Revoredo pesquisou exaustivamente a vida do patrono da imprensa brasileira, não apenas como editor do Correio Braziliense, mas também como diplomata, integrante da maçonaria e estrategista político. Não sei se isso conta a favor ou contra, mas foi de Hipólito a primeira sugestão de transferir a capital do país para o Planalto Central.
Na área jornalística, ele foi realmente um defensor aguerrido de causas democráticas e humanitárias. Basta ler algumas páginas do antigo Correio Braziliense (disponível para consulta na Hemeroteca da Biblioteca Nacional Digital) para se constatar sua visão revolucionária e ao mesmo tempo pacifista. "Nenhuma nação tem o direito de entrar em outra com força armada para obrigar a adotar este ou outro sistema de política interna que o povo não deseja" – escreveu numa edição de 1812.
Defendeu, também, o fim da escravidão de africanos e tratamento digno aos índios botocudos, que os portugueses exploravam e perseguiam sob a alegação de que eram antropófagos. Botocudo era uma denominação depreciativa dada a diversos grupos indígenas que usavam botoques, enfeites de madeira inseridos nos lábios e nas orelhas. Hipólito chegou a ser preso pela Inquisição em Lisboa, mas jamais abandonou suas ideias libertárias.