A questão não é nova e desconfio até que já escrevi a respeito em passagens anteriores de Renato Portaluppi pelo Grêmio. Todas elas, aliás, bem-sucedidas em escalas diferentes, o que se torna muito maior do que reparos recorrentes que se façam ao modo de operação do treinador quando está no clube que o transformou em estátua. Significa que talvez aconteça outras vezes com esta direção ou outras futuras que venham a recontratar o ídolo multicampeão. Porém, se o episódio se repete e vira turbulência com viés de crise, como agora, preciso voltar a ele.
Renato precisa de limites e ninguém no Grêmio é capaz de dar. Pensei até que Alberto Guerra conseguiria quando criticou abertamente a ausência do treinador na coletiva em que explicaria o passeio que levou no Gre-Nal do Brasileirão do ano passado. Quando voltou do Rio de Janeiro, Renato chamou uma entrevista e se desculpou com a torcida, embora deixasse claro que o pedido de perdão não se estendia à imprensa. Nem era mesmo preciso, combinemos.
Não é ao jornalista que Renato deve satisfações e, sim, à imensa massa que o idolatra e, de certa forma, paga seu salário. Quando o contrato foi renovado para 2024, acreditei que algo havia mudado nesta relação de poder, e o treinador se enquadraria a novas regras de subordinação.
Nada. Acaba de acontecer um episódio que reitera o quanto ele segue fazendo o que bem entende sem que seu empregador determine outro comportamento. Não muda a vida do Grêmio ser vice-campeão da Recopa Gaúcha se o episódio for comparado a tudo que o time vai experimentar nesta temporada.
Um porém sobre as resistências de Renato
O fato de Renato ter jogado no lixo a decisão de um título sem razão que justificasse sua ausência em Ijuí mostra que nada mudou no jeito dele de comandar vestiário e se posicionar diante da direção. Não havia motivo para ficar em Porto Alegre. O próximo jogo é na Arena contra o Guarany.
A segunda posição que o Grêmio ocupa não será tirada dele em nenhuma hipótese nesta última rodada. A semana seguinte será toda livre para treinamentos, e o jogo das quartas de final também é na Arena, e o Grêmio tem a vantagem do empate.
Significa que Renato não tinha a menor necessidade de ficar no CT em vez de ver de perto os meninos que ele está lançando, ver como se comportam na hora de uma decisão e, não menos importante, ser visto de perto por uma legião de gremistas que moram longe da Capital e foram privados de conviver com o ídolo. A questão é técnica, mas também institucional. Não vou mergulhar em supostas razões que não posso provar como a resistência de Renato a viagens longas de ônibus ou coisas do gênero.
A questão aqui é só trabalho. Profissionalismo. Renato treina mais do que o time titular do Grêmio. Treina o elenco. Além disso, é idolatrado e move atenções por onde passa para quem veste azul.
Que Renato pretendesse ficar trabalhando no CT, vá lá. A direção é que deveria firmar pé e determinar a ida do treinador ao Interior para a disputa de um título e para se fazer presente onde sua presença era requisitada por gremistas.
Cobrança
Renato já viveu cobrança parecida outras tantas vezes e saiu delas ileso. Carismático, vai para o confronto na entrevista coletiva imediatamente posterior à crise e supera o episódio. Não duvido que aconteça igual desta vez. Diego Costa estreia na Arena, a lógica é o Grêmio vencer o Guarany e logo a seguir jogar às quartas de final.
Se logo adiante o time for campeão pela sétima vez seguida, esta turbulência será lembrada aos risos por Renato enquanto leva um balde de água gelada na cabeça pelos jogadores que pulam e gritam ao redor. Se a direção gremista entende que é assim e assim sempre será, estará chancelando que novos episódios como este de Ijuí aconteçam.
Houve um tempo em que a imensa maioria dos gremistas não daria a menor atenção a este erro estratégico de Renato porque, afinal, é Renato. Hoje, não tenho esta certeza. Os dias seguintes à derrota com direito a olé para o São Luiz em Ijuí foram de muita cobrança nas mesmas redes sociais que sempre levaram livre atitudes como esta do seu ídolo maior.
Cabe à direção entender o contexto, o tamanho da rejeição ao que houve na decisão da Recopa e sinalizar um caminho. Ou, se for mais fácil e estiverem satisfeitos, deixar tudo como está.