O avanço da reforma tributária deve ser celebrado porque ela simplifica a espinha dorsal de um sistema anacrônico. O problema é que o texto fica pior a cada dia que passa. Como é praxe no Brasil, a lista VIP da festa cresce a cada novo pedido. Da base governista à oposição, todos lutam para privilegiar categorias profissionais, setores da economia ou as suas regiões. A consequência é óbvia: para um entrar de graça, outro pagará ingresso mais caro.
Realizar uma reforma tributária no Brasil parecia, de fato, impossível. São décadas de discussão esbarrando no mesmo problema: ninguém abria mão de seus benefícios. Servidores do Ministério da Fazenda e especialistas que trabalharam na proposta admitem que, do ponto de vista técnico, a reforma terá menos efeito a cada nova exceção. Mas eles sabem que a realidade do ponto de vista político é outra, em que a justiça e a lógica nem sempre imperam.
Há defensores da atual proposta argumentando que a simplificação trará um crescimento da economia suficiente para cobrir a redução de carga a determinados segmentos. A tese levará muitos anos para ser ou não comprovada. Já é dado, contudo, que a carga tributária total, inicialmente projetada em 25%, já chegou a no mínimo 27,5% desde que os parlamentares abriram a caixa de presentes.
O percentual final do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que será arrecadado por meio de dois tributos, só deve ser definido na fase de regulamentação da reforma. A tendência é de que o Brasil alcance o maior patamar do imposto entre os 170 países que adotam o IVA. Isso não significa que o custo será maior do que é hoje. Com o sistema tributário fragmentado, há casos em que um imposto incide sobre uma base já tributada, gerando o efeito “bola de neve".
Também é relevante o fato de as exceções terem sido incluídas no texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), e não na fase posterior de regulamentação. Isso significa que uma eventual revisão no futuro dependerá de mudança na Constituição - o que exige grande esforço político.
Na longa lista de beneficiados, chama atenção, por exemplo, o tratamento diferenciado a taxistas, que seguirão com isenção de impostos para compra de veículos. A medida desconsidera a mudança gerada pelos aplicativos. Ou seja, o motorista do Uber, que presta o mesmo serviço, não terá a mesma condição para comprar um carro.
Nos regimes específicos, foram incluídas de última hora atividades desenvolvidas pelas Sociedades Anônimas de Futebol (SAFs). Profissionais liberais também foram premiados com desconto na alíquota de serviços. Portanto, em maior ou menor grau, essas e as outras exceções irão pressionar a cesta de impostos paga por todo mundo.
No Brasil da lista VIP, quem não tem acesso à organização do espetáculo seguirá na arquibancada, torcendo para não aumentar o preço da pipoca.