A declaração do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), sobre o protagonismo político das regiões Sul e Sudeste não justifica a onda de acusações de separatismo e preconceito com o Norte e o Nordeste. O problema é que, como quase tudo no Brasil, a fala foi reduzida a uma disputa político-partidária precoce.
Trata-se de um problema conjuntural e complexo, que não deveria ser confundido com divisão do país ou disputa entre lulistas e bolsonaristas.
A fala de Zema reflete uma percepção óbvia dos governadores do Sul e do Sudeste — que foi externada tardiamente, aliás. Ao sentarem para discutir a reforma tributária, eles perceberam que, sem uma atuação conjunta, seriam sempre minoria nos debates junto a parlamentares das regiões Norte e Nordeste.
A união gerou um efeito imediato. No Conselho Federativo — órgão criado para decidir como será a divisão de recursos vindos da arrecadação do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) entre Estados e municípios —, será considerada a maioria de votos entre os Estados, mas com peso proporcional à população.
O critério foi adotado na votação na Câmara porque, se fosse mantido o mesmo peso para o voto de cada Estado, não haveria votos suficientes entre os deputados para aprovação do texto.
Mas a discussão foi retomada agora, na tramitação da reforma no Senado — onde a representação dos senadores não é proporcional à população, como ocorre na Câmara. Governadores do Sul e Sudeste estão convictos de que haverá tentativas de mexer na regra aprovada pelos deputados federais.
Novamente: não se trata de dividir o país, mas de discutir uma legítima estratégia política de defender os interesses da população que cada autoridade representa.
Nos últimos anos, por mérito próprio, lideranças do Norte e Nordeste assumiram cargos-chave no Congresso — o que ficou evidente durante a reforma. A condução teve forte influência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), de Alagoas, e foi relatada por Aguinaldo Ribeiro (PP), da Paraíba. No Senado, o relator é Eduardo Braga (MDB), do Amazonas.
Na reforma aprovada pelos deputados, em troca de mudanças que prometem o fim da guerra fiscal entre os Estados, o governo criaria um Fundo de Desenvolvimento Regional para financiar projetos de desenvolvimento em Estados mais pobres. Orçado em R$ 40 bilhões a partir de 2033, ele é outro ponto importante nos embates.
Governadores do Sul e Sudeste dizem que seriam contemplados com 13% desse montante — ao mesmo tempo em que reúnem cerca de 56% da população. Argumentam, portanto, que o número absoluto de pessoas de baixa renda é maior.
As distorções sobre a fala de Zema podem ter sido motivadas pela manchete que o jornal "Estadão" utilizou para a longa entrevista com o governador, dando a entender que ele defende uma frente do Sul e Sudeste "contra" o Nordeste. Em nenhum momento ele diz que o bloco atuará contra outra região. É preciso ressaltar, contudo, que o mineiro foi infeliz ao dizer que não se pode "dar um tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixar de lado as que estão produzindo muito".
O fato de o Sul e Sudeste concentrarem 70% das riquezas tem um rosário de explicações e nem de longe significa maior ou menor competência da população de cada região. O Brasil concentrou investimentos e estimulou o crescimento do Sudeste e do Sul por muitas décadas, contribuindo para agravar as desigualdades.
Enfrentar essas diferenças socioeconômicas regionais é um compromisso firmado até mesmo na Constituição. O que Zema e outros governadores, incluindo Eduardo Leite, defendem é simples e legítimo: que não se ignore a pobreza em regiões populosas onde a maioria dos moradores não tem o privilégio de estar entre os mais ricos.