Ainda sem detalhamentos, o Programa Estadual de Revitalização de Bacias Hidrográficas vai fazer, até novembro, um mapeamento da degradação das 25 bacias hidrográficas do Estado. O diretor da empresa de engenharia consultiva Profill, Carlos Bortoli, ajuda a conduzir o estudo. Não tem dúvidas sobre o que precisa ser feito para dar robustez ao sistema de contenção de cheias. Mas destaca que agora é preciso saber "onde aplicar, quanto custa e jogar no tempo", como uma espécie de desenho ampliado para planejamento de longo prazo.
Quais problemas nas bacias hidrográficas do Estado já podem ser identificados?
O trabalho que estamos fazendo para Secretaria Estadual do Meio Ambiente começa ainda em meados de outubro do ano passado. Não precisou do evento de maio para que já começasse. Tem quatro grandes etapas. Uma etapa é o levantamento da situação atual, do ponto de vista da degradação das 25 bacias do Estado. Observamos aspectos bióticos, de geração de sedimentos, de balanço hídrico e de eventos extremos. Juntando essas variáveis, podemos ter um panorama geral do Estado com relação às bacias. Conseguimos perceber problemas de qualidade no Gravataí e no Sinos e problemas de demanda hídrica no Noroeste e no Sul. E especialmente Taquari-Antas e Caí já apontavam para situações críticas relativas a eventos extremos. Em um segundo grau de problemas sobre eventos extremos, vemos o próprio Lago Guaíba, Baixo Jacuí.
Já eram possíveis de ter sido identificados ainda antes de maio?
Era possível perceber quais regiões do Estado estavam mais suscetíveis a problemas de qualidade da água, de quantidade da água, de secas e inundações. O que materializamos é uma fotografia atual e relativizamos as coisas, determinando onde os problemas são mais ou menos graves e frequentes.
E quais seriam as soluções?
Agora se fala muito em desassoreamento dos corpos hídricos e em sistemas de proteção. Todas as soluções têm que ser estudadas no caso a caso. Porto Alegre, por exemplo, pode ser muito bem protegida com uma melhor manutenção do sistema de proteção, ou até uma ampliação. Agora, por exemplo, em Lajeado, Estrela, todo o Vale do Taquari, precisa lidar com ordenamento territorial. Ou seja, aquelas zonas que são mais afetadas vão ter de ser repensadas. Também vai precisar investimento em monitoramento hidrológico em tempo real para um sistema de previsão e alerta. Em alguns lugares, vai fazer sentido também o desassoreamento de corpos hídricos. Mas só isso não vai resolver. Sem falar que no Baixo Jacuí, aquilo que está assoreado em parte dos rios é insumo de consumo civil, é areia. Então, é um conjunto de medidas que precisa ser tomado de maneira integrada. Em boa medida, todo mundo sabe.
Então, a discussão já não é mais o que precisa ser feito, mas onde, quando e como?
A sensação que se tem é que todos estão carecas de saber o que precisa ser feito, agora é planejar as ações. Falamos em ordenamento territorial, desassoreamento, obras de infraestrutura. Tudo isso se sabe. Agora, onde aplicar, quanto custa e jogar no tempo, isso precisa ser feito.
O estudo faz o mapeamento?
Isso. Vai haver um limite até onde conseguimos ir. Muito do que vamos dizer vai se desdobrar em outros procedimentos, estudos e planejamentos. Mas vamos conseguir apontar uma série de medidas.
Em que fase está o estudo?
Está bem avançado. Até o final de novembro, pretendemos terminar o detalhamento.
As ações seriam feitas em que locais?
As unidades de mapeamento onde conseguimos alocar essas ações seriam as 25 bacias. O que pretendemos é avançar para detalhar as ações dentro das bacias.
O que impede que as ações sejam feitas agora?
A rigor, tecnicamente, é possível desenhar isso até com certa precisão. Aí precisa vontade política de fazer as coisas acontecerem. O que impediria é a falta de recurso, que precisa ser destinado e conseguir gastá-lo. E esse arcabouço também não é simples. E não pode ser simples. Estamos falando de recursos grandes, que precisam ser bem fiscalizados. Mas são assuntos de 10 anos para fora para mudarmos. O Plano Rio Grande é de 10 anos para se ter, talvez, uma condição significativamente melhor do que tínhamos antes de maio de 2024. Mas precisa de muito movimento, realmente, para que aconteça em 10 anos.
E existe uma dificuldade também de estar planejando as ações enquanto as coisas acontecem?
É construir o avião enquanto voa. É cultura nacional. Não se tem firme a questão do planejamento de médio e longo prazo. Corremos apagando incêndio.
Mas as mudanças significativas só vêm no longo prazo?
Acho que algumas mudanças significativas vão acontecer agora. No caso Porto Alegre, me parece que o sistema de proteção vai receber investimentos robustos. Foi muito grave o que aconteceu, quase inimaginável. Vai ser irrecorrível e injustificável se as medidas não chegarem no curto prazo. É o grande desafio do administrador público, que está soterrado, só com o nariz para fora d 'água, precisando resolver coisas emergenciais. Mas vai ter que arrumar um jeito de dar uma mirada por cima e olhar o mais pra frente.
*Colaborou João Pedro Cecchini