O jornalista Rafael Vigna colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço
Depois de um ano com doces surpresas como a coluna já havia definido, o Produto Interno Bruto (PIB) do país encerrou 2023 alinhado com as projeções do mercado, em alta de 2,9%, ou seja, bastante próximo dos 3% cravados pelas casas de aposta.
O freio de mão apurado nos últimos três meses do ano, estagnado em 0%, quando comparados ao terceiro trimestre acendem o sinal de alerta. Para o economista e professor da UFRGS, Marcelo Portugal, “está claro que a forte aceleração observada entre 2021 e 2023 acabou em meados de 2023”. A partir de agora, projeta, os resultados serão bem mais contidos.
A avaliação é compartilhada pelo Economista chefa da Farsul, Antônio da Luz. Ele comenta que, apesar de intempéries climáticas no Sul e no Norte, o agronegócio cresceu 15,1% no ano.
Não há outro segmento com dois dígitos de alta o que torna a agropecuária responsável por cerca de um terço do desempenho da economia brasileira do ano passado. Por outro lado, as previsões para este ano não são as melhores e sabe-se, de antemão, que a safra recorde dos últimos períodos não se repetirá:
– É preocupante o resultado trimestral, pois foi 0%, o que mostra desaceleração muito forte na economia brasileira. E em 2024 o Agro não vai ajudar em virtude dos problemas climáticos e de preços enfrentados no país
Na ponta do lápis, o crescimento zero no quarto trimestre repete o patamar do terceiro e denota que há seis meses não há avanços na atividade econômica do país. É o que assinala o professor da FGV e doutor em Economia, Mauro Rochlin, ao assegurar que o consumo das famílias com alta de 3,1% foi o grande destaque pela ampliação da demanda nos últimos meses.
Se de um lado existem indicativos amargos, de outro, emergem as expectativas. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), por exemplo, não frequentava o campo positivo desde o quarto trimestre de 2022, quando exibiu queda de 1,6%. Esse item representa a reserva de dinheiro das empresas para investimentos futuros.
Por isso, é comum ouvir dizer que a FBCF de hoje é 0 PIB de amanhã. E os dados vinham no ritmo do tombo sobre tombo: -3% no primeiro trimestre, -0,2% no segundo e -2,2% no terceiro. No fechamento do ano, ainda que módica, a elevação de 0,9% não impede uma queda de 3% no acumulado do ano, entretanto, quebra um ciclo de cinco trimestres negativos e anima algumas avaliações perspectivas.
Efeito da taxa de Juro
Isso acontece porque uma das análises possíveis, comenta Oscar Frank, economista-chefe da CDL Porto Alegre, para a reversão da trajetória do FBCF é a captação de um primeiro efeito dos sucessivos cortes na Taxa Selic, iniciados em agosto do ano passado pelo Banco Central após muito tempo fixada em 13,75% ao ano, valor proibitivo para a tomada de capital no setor produtivo.
Segundo ele recorda, os impactos podem levar meses para chegar à economia real, mas já há, desde agora, uma avaliação de que a taxa continuará caindo, o que torna menos restritivo o custo dos aportes de médio prazo. Os juros também lançam luz sobre outro elemento que serve para blindar a atividade econômica.
Trata-se do consumo das famílias que fechou o ano com avanço consistente de 3,1%, mesmo que no quarto trimestre de 2023 tenha retrocedido 0,2% – a primeira baixa desde 2021 . Acontece que, aliado ao crédito mais barato, a valorização real do salário-mínimo, os programas de transferência de renda e o mercado de trabalho com taxas de desemprego beirando as margens históricas tendem a ampliar a renda média e a manter as compras aquecidas, acrescenta Frank.
As duas leituras possíveis
De acordo com a Economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, quando se olha para os dados da FBCF, é possível "focar no lado cheia ou vazia do copo". Na parte seca, há redução de 3% em 2023. E, sempre que o investimento se reduz, compromete-se a a capacidade de crescimento futura, com implicações sobre emprego, renda e inflação.
– O desempenho do investimento, todavia, não surpreende. As taxas de juros em níveis reais muito elevadas (a selic real média alcançou 8% em 2023), associado a uma baixa confiança entre o empresariado ao longo do ano e muita incerteza quanto ao futuro ajudam a explicar o número – avalia, ao destacar que a taxa de investimento de 16,5% do PIB é 1,3 ponto percentual menor do que a verificada no ano anterior .
– Mas como eu disse anteriormente, há também o lado cheio do copo. A FBCF encerrou o ano crescendo 0,9%. A última vez que a FBCF tinha apresentado alta na comparação com o trimestre imediatamente anterior foi no terceiro trimestre de 2022.
Com a perspectiva de taxas de juros reais menores e maior facilidade de acesso a crédito para as empresas, ela espera melhor evolução em 2024. Ainda assim, Patrícia percebe cenário de desafios para os investimentos. Ela lembra que, ainda que menores, as taxas de juros reais permanecerão em patamares elevados.