A severa tempestade do dia 16 de janeiro ainda provoca legítima indignação entre os clientes da CEEE Equatorial e da RGE que, uma semana depois, ainda não tiveram seu abastecimento de energia restabelecido.
Também expôs a falta de prevenção no serviço público de fornecimento de água em Porto Alegre e deixou um rastro de árvores e galhos caídos pela cidade, que leitores descrevem como "cenário de destruição". Nesta terça-feira (23), a prefeitura de Porto Alegre comunicou a seus cidadãos, que articula, com "Estado e CEEE (...) cooperação para podas e supressão de árvores (leia aqui)".
Supressão? Corte, decréscimo, diminuição, limitação e perda são sinônimo. O papel das árvores nos problemas relacionados a eventos extremos na capital gaúcha não o é o de vilãs. As árvores não são inimigas da mitigação das mudanças climáticas. Ao contrário, são aliadas. Desde, claro, que sejam tratadas dessa forma. Por isso, para suprimir apenas uma árvore que seja, é preciso criar regras muito estritas, sob pena de agravar fenômenos que já assolam o planeta.
É certo que as consequências do novo comportamento meteorológico exigem mais atenção à chamada gestão vegetal, com retirada preventiva de unidades já comprometidas. Mas para podar ou retirar uma árvore, medo de queda ou perturbação em fios que deveriam ser isolados não é argumento suficiente. É preciso ter certeza de que o risco que oferece é maior do que os benefícios que aporta.
Para isso, é urgente que se adote uma administração da arborização responsável e consciente: quem tem uma árvore que represente ameaça não pode esperar até que o problema se confirme, na (s) próxima (s) tempestade (s), mas sempre que possível é melhor manter árvores por perto. Essa foi a promessa da secretária de Meio Ambiente e Infraestrutura, Marjorie Kauffman:
— É o acordo de cooperação com grupos técnicos que vai definir os parâmetros desse trabalho.
É preciso muito cuidado com a supressão. Para prevenir danos ainda mais severos, a vegetação é essencial, tanto árvores altas de raízes profundas, quanto arbustos fixados no solo de forma mais superficial. O entramado das raízes em vários níveis ajuda a absorver água e a fixar o terreno, reduzindo a ocorrência de deslizamentos, em locais mais elevados, e a formação de lama nos mais baixos - quem teve trabalho para limpar a que se formou no dia seguinte ao temporal (17) sabe bem do que se trata.
Além disso, tempestades severas não são a única consequência da mudança no clima. Há também ondas de frio - que atingiram o norte dos Estados Unidos e da Europa na semana passada - e de calor extremos - como a que abateu o Brasil há três meses. O melhor paliativo coletivo para temperaturas muito altas é solo mais permeável - característica para a qual a vegetação contribui - e sombreamento. É bom lembrar das recomendações, em entrevista à coluna, do meteorologista australiano John Nairn, consultor sênior em calor extremo da Organização Meteorológica Mundial (OMM), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU):
— Como sou especialista em ondas de calor, é preciso aumentar o resfriamento do ambiente das cidades, diminuindo a concentração de calor. Um grande problema são as superfícies que absorvem demais o calor. Cidades com mais superfícies porosas aumentam o resfriamento. Outra estratégia é aumentar os lugares com sombras nas cidades, principalmente com o plantio de árvores, e até com painéis solares.
Isso, sem contar a óbvia captura do dióxido de carbono que todos aprendemos na escola com o nome de fotossíntese. Esqueceu? A coluna lembra: esse nome bonito que significa "síntese pela luz" descreve o processo de absorção de luz solar e CO2 pelas plantas, que os transformam em substâncias orgânicas para elaborar a seiva, o "sangue" dos vegetais. Em troca, liberam oxigênio e deixam o ar mais fresco.