O jornalista Rafael Vigna colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço
Economista graduado pela PUCRS, João Pedro Maffessoni atuou como Assessor Técnico do Gabinete do Ministério da Cidadania, da Secretaria-Executiva do Ministério da Cidadania e na chefia de gabinete da Secretaria de Planejamento e Assuntos Estratégicos do Município de Porto Alegre. Atualmente conclui mestrado em Economia na mesma universidade em que o candidato Javier Milei, que defende a dolarização da economia argentina de formou.
Em que contexto os argentinos foram às urnas?
Desde 1962, são 17 eventos de grave crise cambial ou monetária na Argentina, que envolvem depreciação monetária, hiperinflação, ou corrida contra o dólar. O motivo é o histórico fiscal. A Argentina gasta excessivamente. O déficit fiscal em proporção ao PIB (Produto Interno Bruto) é crescente. Houve tentativas de frear por breve período, nos anos 1990 e aconteceu superávit, no início do governo Nestor Kirchner. Mas é o problema fiscal a raiz de toda a inflação argentina.
Há entre os candidatos alguém com mais condições resolver?
São três candidatos com chances. Javier Milei e Sergio Massa são adeptos de populismos fiscais. Um país endividado e à beira da hiperinflação não deve abdicar de imposto. Mas Massa (ministro da Fazenda) mandou pacote ao parlamento, recentemente, com série de renúncias fiscais. Milei, que é deputado, votou a favor. Há populismo em todos os lados.
E a proposta de dolarizar a economia?
Manter dolarização em longo prazo custa mais caro do que traria eventualmente em vantagens. Os argentinos estão tão desolados que parecem dispostos a correr esse risco que envolve abrir mão da política monetária como instrumento econômico. Significa perder domínio e possibilidade de ação diante de crises. Se assemelha ao que ocorreu com a Grécia, quando ingressou na Zona do Euro e a recessão foi muito pior do que seria se houvesse essa variável (política monetária). É o risco argentino. O mais crítico é que, dependendo do nível de reservas, o plano poderá ser custoso também no curto prazo. Uma coisa é fazer a dolarização com excesso de reservas. Estima-se que seriam necessários $ 40 bilhões. Milei, ao chamar o peso de “excremento”, quer dizer que pretende fazer isso a todo custo, à preço de mercado. Nesse caso, faltariam dólares para fazer a conversão. E, no momento em que se anuncia a data da dolarização, sabe-se que o peso vai valer menos e as pessoas vão buscar converter antes, o que depreciaria ainda mais a taxa de câmbio e colocaria mais pressão sobre a inflação.
Isso já não ocorre?
De certa forma o país já vive isso, desde as primárias (em agosto, quando na madrugada da eleição houve depreciação de 30%) justamente porque as pessoas e mercado anteveem o que pode acontecer e tentam se livrar dos pesos o que coloca mais pressão inflacionária. Por exemplo, hoje essa corrida contra o peso é o que deixa o país à beira de uma hiperinflação.
Até onde vai a onda Milei é a busca por resolução imediata?
A sensação é algo muito semelhante ao fenômeno que ocorreu no Brasil em 2018. Milei surge da ideia populista de que o peronismo e antigo partido do Mauricio Macri (ex-presidente) no poder há 40 anos não fizeram pelo país. Porém, o próprio discurso sobre a dolarização não se sustenta. Se bem-feita poderia resolver algo, mas hoje não há condições. No campos do populismo econômico, não adianta resolver a política monetária enquanto não resolver o desequilíbrio fiscal.