O regresso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Brasil é marcado pelo balanço de perdas & ganhos de sua viagem à China. No primeiro ponto, pesaram mais as declarações presidenciais do que qualquer acordo firmado - inclusive porque os apresentados são mais ensaios do que projetos firmes, o que fragiliza a avaliação de eventuais benefícios.
No entanto, há nuances: foi evitado o gesto que simbolizaria um alinhamento concreto do Brasil à China - temido por representantes do governo americano -, porque não ocorreu a especulada adesão à Iniciativa Cinturão e Rota, a chamada nova rota da seda.
Conforme apuração da repórter da Folha de S.Paulo Patrícia Campos Mello (leia clicando aqui), o que mais feriu ouvidos oficiais nos EUA não foi só o discurso contra o dólar nas transações globais, mas especialmente a menções ao suposto papel de "incentivo" dos americanos à guerra entre Rússia e Ucrânia.
A suposta alternativa a moedas conversíveis foi moderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao lembrar que a ideia de negociar com moedas próprias "está há muito tempo na mesa de negociação, entre os Brics, no âmbito do Mercosul". Como a coluna já mencionou, mesmo ensaiada muito antes, a alternativa de pagamento na região não evoluiu.
Haddad ainda jogou o assunto para o longo prazo ao afirmar que a "ideia volta à mesa para que aprofundemos esse tema e possamos promover intercâmbio comercial com base nessa filosofia". E reiterou:
— Não há nenhuma preferência do Brasil (entre China e EUA). Pelo contrário, queremos ampliar ao máximo as parceiras do Brasil, como o presidente Lula fez durante seus dois mandatos.
Essa é a tradição do Itamaraty - a equidistância entre potências -, a recomendação de analistas econômicos e a esperança de representações de aliados no Brasil. No entanto, se é capaz de acalmar mercados no Brasil, o discurso de Haddad não ecoa como o de Lula nos círculos diplomáticos internacionais.
Especialistas ponderam que palavras duras são parte do jogo, até porque a viagem de Lula aos EUA também não "rendeu" o que se esperava e "ameaçar" uma aproximação com a China seria uma forma de pressão para obter mais. Mas é preciso calibrar a pressão exatamente para não ser ouvida como ameaça. O atual presidente, ao contrário do antecessor, pratica a chamada diplomacia presidencial, o que é positivo na teoria. Para ser bem-sucedido na prática, porém, faltou ênfase na primeira palavra da expressão.