Primeira disputa de poder dentro do novo governo, a decisão sobre a prorrogação ou não da isenção de tributos federais sobre gasolina, diesel e gás de cozinha expôs o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Estava tudo encaminhado para que o prazo fosse esticado ainda pelo agora ex-ministro Paulo Guedes, mas Haddad pediu, publicamente, para que ele não o fizesse.
— Qual é a urgência de tomar medidas a três dias da posse? Sobretudo em temas que podem ser decididos sem atropelo, para que tenhamos a sobriedade de fazer cálculo de impactos, verificar trajetória do que esperamos das contas públicas ao longos dos últimos anos — disse Haddad na quarta-feira (28/12).
A menção à trajetória das contas públicas soou como música para o mercado: seria uma oportunidade de "abater" R$ 54 bilhões do gigantesco déficit de R$ 221 bilhões criado no orçamento de 2023 depois da aprovação da PEC da Transição. Esse é o tamanho da renúncia fiscal provocado pela isenção. E Haddad também havia afirmado que o ano não terminaria com um "prejuízo" desse tamanho, porque cortaria gastos e reduziria subsídios - o dos combustíveis é um desses instrumentos, criado para tentar facilitar a reeleição do agora ex-presidente.
Na sexta-feira (30), porém, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, defendeu a prorrogação por ao menos três meses, até que houvesse "uma solução mais sustentável". E deixou claro que essa "solução" passa pela mudança na política de preços da Petrobras, confirmada pouco depois pelo indicado à presidência da Petrobras, Jean Paul Prates. Foi a visão que prevaleceu.
Na cerimônia de transmissão de cargo nesta segunda-feira (2)- com a participação da colega do Planejamento, Simone Tebet -, Haddad não tocou no assunto. Reafirmou sua intenção de reforçar as parcerias público-privadas (PPPs):
— Temos bons projetos, é bom que o setor privado esteja atento a oportunidades. Precisamos sair desse pensamento binário, público ou privado (...) Não somos dogmáticos, somos pragmáticos. Queremos resultados, mas seguimos princípios e valores. Me sinto confortável tendo, na equipe econômica, Geraldo Alckmin, Simone Tebet e Esther Dwek. Antes, tudo isso era um Posto Ipiranga. Agora, é uma rede de postos. São quatro que vão fazer a diferença no Brasil.
Sobre o que mais se espera na Fazenda neste momento, arcabouço fiscal, Haddad afirmou que será apresentado "no primeiro momento" e "vai demonstrar tecnicamente sua capacidade de sustentar as finanças públicas". Conforme o ministro, o formato será capaz de financiar o guarda-chuva das prioridades do governo e garantir a sustentabilidade da dívida pública. Também se comprometeu com a transparência - escassa na gestão anterior:
— Não haverá nada opaco nesse ministério. A Lei de Acesso à Informação será rigorosamente cumprida. Não vamos nos esconder em lugar nenhum. E não estamos aqui para aventuras (alusão a políticas associadas ao mandato de Dilma Rousseff).
Ao apresentar a equipe, Haddad afirmou que todos têm formação e ocupação compatíveis para o cargo, afirmou que quer almoçar todos os dias com todos os que puderem participar para fazer um "toró de palpites" e ajudar na busca de soluções para a Fazenda e os demais ministérios. Citou a todos, mas fez questão de fazer uma espécie de desagravo a Guilherme Mello, secretário de Política Econômica que tem sido muito criticado no mercado e entre economistas tradicionais:
— Guilherme tem duas características incomuns entre economistas, coragem e humildade. Enquanto eu estava sozinho na rua, em 2018, ele me defendia em debates econômicos. Pouca gente se dispôs a fazer o que a história exigia.