No mesmo dia em que o ministro da Previdência, Carlos Lupi, aprofundou as preocupações do mercado e de economistas falando em rever a reforma da Previdência - que levou quase 24 horas para ser desmentida -, um bom discurso foi abafado por esse tipo de ruído.
Enquanto Lupi falava em ausência de déficit na Previdência - quando o orçamento de 2023 aponta falta de R$ 363 bilhões, contando INSS, servidores públicos e militares inativos -, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, falava em preocupação com a "qualidade do gasto público".
Ao comentar o novo arcabouço fiscal, ou seja, o mecanismo que vai substituir o teto de gastos para evitar que a dívida pública fique sem controle, Galípolo afirmou que incluirá uma "lógica quantitativa do gasto". Isso significa que não será focado apenas em uma meta de dívida, considerada difícil de gerenciar por incluir variáveis fora do alcance do executivo. Também afirmou ter consciência de que a alternativa precisa ser "crível e factível".
E além da questão quantitativa, avisou que o ministério avaliará a qualitativa, por existir o diagnóstico de que o Estado "gasta mal". É um diagnóstico quase unânime entre especialistas em contas públicas: o maior problema do orçamento não é só o tamanho da despesa, mas o efeito obtido com esses desembolsos. Em primeiro lugar, não há avaliação efetiva de resultados em todos os casos. Em segundo, quando há, falta efetividades na solução dos problemas.
— Não vamos aceitar esses R$ 230 bilhões de déficit - avisou Galípolo sobre o resultado negativo do orçamento deste ano, no valor exato de R$ 231,5 bilhões.
O secretário-executivo adiantou que a redução desse rombo terá dois pilares: arrecadação e cortes de gasto. No primeiro caso, disse que as renúncias fiscais adotadas durante o período eleitoral serão revistas para "ver o que faz sentido técnico". No segundo, mencionou que, nos últimos meses, foram "retirados vários filtros" de programas sociais, provocando aumento artificial no universo de beneficiários.
O próprio Galípolo afirmou que "secretário-executivo manda muito menos do que parece" (por assinar muitos atos no Diário Oficial da União), mas é o nome mais identificado com o mercado no governo Lula. Lembrou que participou das primeiras parcerias público-privadas (PPPs) no governo Alkmin em São Paulo e contribuiu na modelagem da privatização do saneamento no Rio de Janeiro (diferente do modelo escolhido no Rio Grande do Sul). Os próximos dias mostrarão qual o som predominante: a melodia ou o ruído.