Todo perfurado, o teto de gastos que limita as despesas públicas no Brasil nos últimos seis anos será substituído. Hoje, a estrutura parece ter sido atingida por uma tempestade — um pedaço foi arrancado, o que ficou parece uma peneira.
Depois de admitir em evento da XP no início deste mês, que passou do limite — "sim, violamos o teto de gastos, mas com responsabilidade fiscal" — o ministro da Economia, Paulo Guedes, já prepara uma alternativa.
E a remoção do teto é uma das poucas, mas nem tão raras, convergências entre os dois candidatos mais bem posicionados nas pesquisas de intenção de voto. Se Guedes prepara um puxadinho, com a bênção de Jair Bolsonaro (PL), seu adversário Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avisouque também não quer teto. Conforme o texto do plano de governo do petista, para "recolocar os pobres e os trabalhadores no orçamento (...) é preciso revogar o teto de gastos e rever o atual regime fiscal brasileiro, atualmente disfuncional e sem credibilidade".
Mas o que virá depois do teto? O plano do PT é vago: "Construiremos um novo regime fiscal, que disponha de credibilidade, previsibilidade e sustentabilidade (...) possua flexibilidade e garanta a atuação anticíclica, que promova a transparência e o acompanhamento da relação custo-benefício das políticas públicas". O texto avança mais em intenções, mas não oferece mais pistas sobre o formato.
Guedes já indicou o caminho: pretende um sistema semelhante ao de meta de inflação. O alvo, nesse caso, não seria o gasto (um meio), mas a própria dívida (o fim). Para lembrar, o teto foi adotado em 2016, determinando que o aumento do gasto da União (Executivo, Legislativo e Judiciário) é limitado à variação da inflação do ano anterior (o parâmetro do tempo de cálculo, aliás, foi o primeiro furo).
O formato é mais focado, mas precisa ter um mecanismo mais eficiente de contenção do que o teto de inflação. Como ocorreu em 2021, já está caracterizado neste ano e há risco de que se repita em 2023, quando o teto da meta de inflação é rompido, a única consequência é uma cartinha do presidente do Banco Central (BC) explicando o estouro e dizendo o que fará para evitar que ocorra outra vez. Como se viu, não é suficiente.
Se inflação alta é ruim, dívida muito elevada é pior. A dívida bruta do setor público do Brasil está hoje em 78,2% do Produto Interno Bruto (PIB). É menor do que em 2020 — quando os gastos com a pandemia levaram ao recorde de 89% —, mas segue muito acima da média dos países emergentes, de 66,3% do PIB, conforme o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Se a dívida explode, leva junto o risco Brasil e o dólar, que por sua vez retroalimentam inflação e necessidade de aperto no juro. Já vimos esse filme. Só não podemos repetir a canção que é bonitinha, mas assusta se for aplicada ao caso: "Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada".