A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição enfatiza uma contraposição recorrente no país. Trata-se do discurso que coloca política e economia em lados opostos, num duelo em que não há vencedores.
Necessária para abrir espaço no orçamento de 2023, para gastos bilionários previstos no governo Bolsonaro, a proposta tem sido acrescida com itens de promessas de campanha de Lula. A expectativa é incorporar cerca de R$ 200 bilhões fora do teto para transferência de renda (R$ 105 bilhões), benefício às famílias com crianças até 6 anos (R$ 75 bilhões) e receita extra para investimentos (R$ 23 bilhões).
Não tardou para o Congresso barganhar a aprovação com uma regra que obrigue o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva a pagar emendas do orçamento secreto (R$ 20 bilhões, em 2023). E assim a PEC tapa-furo se encaminha para abrir um buraco sem fundos.
Mas e as consequências? De imediato, gastos significam dívida. O Banco Central (BC), por exemplo, há tempos aponta em seus comunicados os riscos do descontrole fiscal para a inflação. O problema é que o pilar da economia, a política fiscal, parece não encaixar bons slogans eleitorais e outros temas tem mais potencial de gerar votos.
Antes da PEC, comenta o economista-chefe da Austin Ranting, agência de classificação de risco, Alex Agostini, o cenário era de estabilidade para a taxa Selic em 13,75% até meados de 2023 quando começariam as quedas. Agora, se prevê aumento da taxa, em razão da elevação do risco fiscal.
Quando os juros sobem, a economia trava, cria-se um ciclo que puxa crescimento – estimado de 1% para 2023 – para níveis mais baixos, inclusive com riscos de recessão. O desarranjo macroeconômico afeta a cadeia produtiva e de investidores, que adiam expansão e contratações.
O câmbio desvaloriza. Investidores (que financiam o governo com a compra títulos públicos), cobram prêmios de risco mais caros (juros que fermentam a dívida pública).
No ambiente de desconfiança, a demanda por moeda estrangeira acelera. Configura-se o “pass-through” que transfere o impacto da desvalorização do real para a inflação. A alta dos preços, lembra Agostini, atinge alimentos e produtos consumidos pelas mesmas famílias que recebem auxílio. No final das contas, afirma o economista, é como se o governo desse, com uma mão, o reajuste, e, com a outra, retirasse o poder de compra, corroído pela inflação,associada a má gestão fiscal. .