Foi exatamente dentro do previsto o resultado da privatização da Eletrobras, o que credencia a operação como bem-sucedida. É muito, dadas as dúvidas sobre a viabilidade da capitalização que prevaleciam dias antes da oferta.
Os R$ 33,7 bilhões obtidos com a venda dos dois lotes, o básico e o suplementar, situam a privatização da Eletrobras como a segunda maior da história do país, atrás apenas da Telebras, considerados os valores convertidos em dólares.
É um feito para o governo Bolsonaro, na perspectiva da promessa de fazer privatizações que marcou a campanha e, especialmente, o discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes. Mas só foi possível porque, ao embalar o pacote da capitalização, entrou um megajabuti que, segundo várias entidades do setor elétrico, vai espetar também uma megaconta para os consumidores de eletricidade.
Nesse megacasco, estão abrigados projeto de cinco usinas térmicas abastecidas a gás natural nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste. Nas duas primeiras, não há gasodutos para alimentar as termelétricas. Ou seja, além das plantas, terá de ser implantada uma rede de dutos. Os cálculos da conta que espera o consumidor variam de R$ 20 bilhões a R$ 300 bilhões. Na área técnica do governo, que também torceu o nariz para o jabuti, o argumento é de que esse foi o preço para garantir o apoio do Centrão para aprovar o projeto.
À coluna, o ex-secretário de Desestatização do governo Bolsonaro, Salim Mattar, já havia dito que "é mais barato privatizar com jabuti do que não privatizar". Há expectativa de que a Eletrobras privatizada se torne mais competitiva e ganhe mais capacidade de investimento. Como ocorreu com a CEEE-D no Estado, uma das primeiras iniciativas sob controle privado será um programa de demissão voluntária
Certo, mas e se a Eletrobras foi privatizada, quem é o novo dono? No formato de capitalização definido pelo governo, não há um controlador definido. A estatal de energia elétrica vira uma "corporation", como é a Lojas Renner. O governo ficou com cerca de 40% das ações, além da chamada "golden share" (ação com poderes especiais), que permite vetar mudanças drásticas no estatuto da companhia.
Conforme informações de mercado, curiosamente os dois maiores novos acionistas da são formados por recursos públicos: o fundo soberano de Cingapura e o braço de investimentos do Canada Pension Plan, o CPPI, formado por recursos de servidores aposentados. Entre os nacionais, a 3G Radar, que já era acionista, reforçou sua posição, além da SPX Capital, que tem como sócio Beny Parnes, ex-diretor do Banco Central, e a Truxt Investmentos, liderada por um brasileiro que foi executivo do JPMorgan, José Tovar.
E uma informação já prevista no prospecto de oferta que só agora ganha relevância é sobre o destino da maior parte da arrecadação com a venda das ações: R$ 25,3 bilhões devem ser destinados ao pagamento ao Tesouro, pela Eletrobras privada, pelas outorgas das usinas hidrelétricas que terão os seus contratos alterados.
Guedes havia cogitado usar recursos da capitalização para bancar a compensação a Estados pela reduções e isenções de ICMS sobre combustíveis. Vão sobrar, na melhor das hipóteses, R$ 8,4 bilhões, para uma necessidade que passa dos R$ 100 bilhões, conforme estimativas preliminares.