As decisões da superquarta vieram 100% dentro do esperado e, mesmo assim, no day after, a bolsa despenca e o dólar dispara no Brasil. No final da manhã desta quinta-feira (5), a moeda norte-americana tem alta superior a 3% ante o real, enquanto a bolsa cai acima de 4%, movimentos de dimensão rara no mercado financeiro.
Na quarta-feira, mesmo com a temida "maior alta de juro em 22 anos anos nos Estados Unidos" e a expectativa de nova alta no Brasil confirmadas, a bolsa havia até fechado em leve alta, e o dólar, em baixa. O que aconteceu durante a noite?
Até o aviso do Banco Central (BC) de que não foi possível encerrar o ciclo de alta do juro no Brasil neste mês era esperado, ao menos por parte do mercado. E esse movimento de fuga do risco não é restrito ao Brasil. Por isso, os analistas atribuem a reação forte mais ao cenário internacional do que ao local.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o índice Dow Jones da bolsa de Nova York também despenca mais de 3% — o que por lá é ainda mais raro do que por aqui — , e a Nasdap, a bolsa de tecnologia, tem tombo ainda maior, acima de 4%. Lá e aqui, boa parte desse movimento de fuga de risco ainda é atribuído às decisões do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). Tanto à alta do juro quanto ao início do enxugamento da liquidez do mercado (confira os detalhes clicando aqui).
— Hoje é que está reagindo certo, ontem o mercado quis 'dar uma operada', não deu para entender (a reação otimista). Não engoli aquela história de que estava tudo ok porque o Fed não iria elevar o juro em mais de 0,5 ponto nas próximas reuniões. Mas o mercado é assim, imprevisível. Sempre brinco que a beleza do mercado está na sua incoerência. Mas hoje é a reação adequada ao cenário de uma desaceleração global, da qual o Brasil não vai ficar fora — observa Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
Roberto Padovani, que já havia advertido para o papel do Fed para o câmbio no Brasil, admite que a "explicação é difícil" para o otimismo da superquarta e o superpessimismo do day after. Mas pondera que, na véspera, a grande preocupação do mercado era com a possibilidade de que o BC dos EUA desse um sinal de aceleração ainda maior do aperto monetário. Como não veio, houve alívio. Mas o aviso do Fed de que é "data dependent" (dependente de dados, ou seja, condiciona sua atuação ao que ocorrer na economia) adiciona preocupação quando está claro que os indicadores não serão bons.
— O que a gente está vendo no mundo é mais choque, não menos choque. Não há sinal de normalização das cadeias produtivas, o que significa cenário muito complicado de inflação. Hoje (quinta, 5), declarações dos bancos centrais da Inglaterra e da Europa reforçam a preocupação com a inflação e colocaram novamente o tema no radar. Os mercados passaram a reprecificar o cenário de juro — avalia Padovani.