Como a coluna já observou, o discurso do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, sobre o risco de apagão no Brasil é tranquilizador, o que está correto. Mas entre o discurso e a ameaça concreta de medidas de racionalização, talvez até racionamento, a prática é outra.
Na segunda-feira, o Ministério de Minas de Energia (MME) informou ter publicado uma portaria em que amplia para outros combustíveis, além do gás natural, o uso emergencial de termelétricas, mesmo sem contrato. Abriu a temporada de caça às usinas.
Pelas regras do sistema elétrico nacional, só podem operar — despachar, no jargão do setor — usinas que tenham contrato negociado em leilões públicos, no caso dos mercado cativo (formado pelos clientes das distribuidoras). Usinas "não contratadas" são direcionadas a contratos de curto prazo no mercado livre (formado por grandes consumidores que fazer acertos individuais para fornecimento de energia).
No mês passado, o MME já havia admitido o despacho de qualquer usina abastecida com gás natural. Com a permissão, agora, para qualquer combustível, eleva a dimensão da excepcionalidade no fornecimento de energia no país. Vai ser como buscar agulha em palheiro, porque há raras usinas prontas e sem contrato. Mas o MME também está correto em combinar discurso tranquilizador e busca de alternativas, mesmo que quase desesperadas, para ampliar a oferta de energia.
Nesse cenário, ganhou mais pressão o programa de modernização do parque térmico a carvão, que envolve principalmente Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O princípio é substituir usinas antigas, mais poluentes, por novas plantas com tecnologia mais avançada e, portanto, menos emissões. Mas a discussão do tema com o governo, que já tem mais de cinco anos, ficou para "julho ou agosto", segundo Fernando Zancan, presidente da Associação Brasileira do Carvão Mineral (ABCM).
Enquanto isso, apesar dos anúncios, a termelétrica a gás natural de Uruguaiana permanece sem operar, mesmo em plena crise hídrica e necessidade desesperadora de gerações, como indicam a sucessivas portarias do MME. No Rio Grande do Sul, por exemplo, só estão operando as térmicas Pampa Sul (Engie), Candiota 3 (Eletrosul), ambas a carvão, e Canoas, que apesar de apta a gerar com gás continua queimando óleo combustível para gerar eletricidade por falta do combustível mais barato e menos poluente.
A situação
A coluna já explicou que falta de chuva é mais grave na Bacia do Rio Paraná, mas vai muito além de um problema regional porque ameaça algumas das maiores geradoras de energia hídrica do Brasil: Itaipu, Jupiá, Ilha Solteira e Porto Primavera. E já detalhou que, desta vez, o Rio Grande do Sul não terá "desculpa" para ficar de fora de eventuais medidas de racionalização ou racionamento. Para poupar água nos reservatórios, a saída é colocar em operação o maior número possível de termelétricas, que queimam algum tipo de combustível — biomassa, resíduos, gás, óleo e carvão — para gerar energia.