O inédito alerta de emergência hídrica acionado na sexta-feira (28) pelo Sistema Nacional de Meteorologia vale para para cinco Estados — Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná — de junho a setembro.
Mas a falta de chuva na Bacia do Rio Paraná ameaça algumas das maiores geradoras de energia hídrica do Brasil: Itaipu, Jupiá, Ilha Solteira e Porto Primavera. Isso significa que, se não for possível evitar cortes de eletricidade, devem atingir todo o país, não apenas a região específica.
Em 2001, quando houve o mais recente período de racionamento de energia no país, o Rio Grande do Sul ficou fora da redução compulsória de consumo por falta de conexão suficiente para enviar energia ao sistema interligado nacional. Agora, caso seja necessário reduzir o consumo de forma obrigatória, não haveria desculpas para os gaúchos serem excluídos.
— Temos um sistema robusto, a interligação com o país não é mais problema. A situação é de alerta, porque nossos reservatórios vão chegar a uma situação preocupante com a escassez de chuva — afirma Eberson Silveira, diretor do Departamento de Energia da Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema).
O Brasil tem o Sistema Interligado Nacional de Energia (SIN) que, como o nome diz, interconecta todos os Estados. As obras de transmissão de eletricidade que avançam com rapidez no Estado para compensar o atraso da obra que deveria ter sido executada pela Eletrosul são, ao mesmo tempo, uma vantagem e uma desvantagem para os gaúchos. Conforme Eberson, são nove lotes de obras que somam investimentos de R$ 6,5 bilhões. O lado bom é que uma rede robusta consegue aproveitar melhor a corrente disponível. O mau é que as conexões com o sistema nacional ficaram ainda mais fortes.
Conforme o diretor de Energia, a região Centro-Oeste e Sul, uma só para efeito do SIN, representa 60% da capacidade de armazenamento do Brasil, que por sua vez consome energia que tem 60% dependente de fonte hídrica. No Estado, a dependência de hidrelétricas é ligeiramente menor, de 50%, mas 32% do abastecimento dos gaúchos vem de fora do Estado, ou sejas, depende do SIN.
— Temos uma forte dependência hidroeletricidade. O Brasil vai ter de apostar também na base térmica, preferentemente de gás, que é mais limpo e cria rede de gasodutos, o que nos beneficia — diz Eberson.
Edison Deitos, coordenador do Grupo Temático de Energia e Telecomunicações da Fiergs, tem uma esperança, mais do que uma certeza:
— Não acredito em racionamento.
Mas admite que é mais uma questão de crença do que de base técnica para garantir de que não haverá apagão. A expectativa mais ancorada nos fatos é de que o alerta antecipado e a maior geração das térmicas, apesar de aumentarem o custo da energia, permitam poupar os reservatórios das hidrelétricas:
— As térmicas foram acionadas com certa antecipação, então não vejo risco tão elevado assim para o país. O problema é que, no setor elétrico, não tem toque mágico, é preciso visão de longo prazo. Essa nova crise que está se desenhando vai possibilitar que as autoridades pensem mais no longo prazo.
Deitos avalia que a atual crise hídrica decorre da falta de chuva, como ocorreu em 2001, mas também como na época, de problemas de planejamento e decisões erradas. O empresário aponta como equívocos a construção de grandes usinas a fio d'água (sem grande reservatório), como Belo Monte, e a transformação de grandes projetos em pequenas centrais hidrelétricas (PCHs).
No Estado, uma decisão de outro órgão regulador do setor, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), impediu a construção de parques eólicos em áreas com mais vento. Deitos pondera que as fontes renováveis, como solar e eólica, "ajudam mas não resolvem". O problema, detalha, é que não são fontes de "energia firme". Dependem de ter sol e ter vento para gerar. Por isso, costumam ser chamadas de "intermitentes".
O empresário lamenta, ainda, a decisão do Ministério Público que impediu a construção de uma térmica abastecida com gás natural liquefeito em Rio Grande. Se não tivesse ocorrido a proibição da instalação de um terminal flutuante, como agora será feito em Santa Catarina, haveria uma usina com combustível mais barato e mais limpo no Estado.
— Agora conseguiram reverter a decisão da Aneel, que talvez não recorra justamente pela falta de energia. Se sair, será importante para a próxima crise. É importante levantar essas questões agora, porque poderia estar pronta.