Sem vacina em quantidade minimamente suficiente, sem espaço fiscal para uma renovação integral do auxílio emergencial e com a pandemia ainda se agravando, o início de 2021 não é aquele mar de brigadeiro desenhado por economistas no final do ano passado.
Ao grave conjunto de incertezas já existentes, somou-se uma mais, imprevisível: o comportamento do novo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. No discurso, não tomaria decisões monocráticas e consultaria sempre o plenário. Na prática, deu uma canetada, desmontou uma composição para a mesa diretora já alinhavada e mergulhou a casa em indefinições no dia seguinte à sua vitória retumbante.
No mercado financeiro, os números eram de aprovação na tarde desta terça-feira (2), embora sem muito entusiasmo na bolsa (leve alta de 0,3% faltando uma hora para o fechamento). No câmbio, parece haver mais confiança, com queda de 1,7% na cotação da moeda americana ante o real, que fechou em R$ 5,35.
Se a reação quantitativa é favorável, a qualitativa é cheia de "mas". Paulo Gama, analista político da XP Investimentos, constata que a eleição nas duas casas se trata de uma "vitória do Planalto, ao mesmo tempo em que se evidencia a força do Centrão". Como sabe quem conhece a história do Brasil, essa força política é 100% fiel apenas a si mesma e costuma cobrar caro o apoio que empresta temporariamente.
– O equilíbrio instável entre as duas forças deve ser uma tônica deste biênio. Lira defendeu de maneira geral o avanço das reformas, assim como mencionou, sem detalhar, a necessidade de ajuda a quem está em situação de desespero econômico por causa da covid.
Gama vê "um período inicial em que o deputado ouvirá do Planalto as demandas de agenda para negociar prioridades", mas não detalha o que viria depois, observando apenas que a primeira decisão de Lira demonstra que "todas as armas disponíveis serão usadas nas batalhas contra o inimigo da vez, seja ele quem for". E pondera:
– No médio prazo, se a relação com os deputados continuar a ser nutrida da maneira como foi durante a disputa pela presidência da Câmara, abre-se uma janela — curta, é verdade — para que o Planalto apresente sua agenda para jogo. Vai do presidente Jair Bolsonaro ter equilíbrio e saber escolher prioridades para poder aproveitá-la.
Matheus Jaconeli, economista da Nova Futura Investimentos, diz que para boa parte dos agentes, a expectativa é de alívio ao governo, afastando o risco de impeachment, e avanço nas reformas tributária e administrativa, além das PECs Emergencial e do pacto federativo. Mas para que o bom humor se mantenha, adverte, é preciso que haja em "horizonte razoável" (cerca de três meses) sinais efetivos de aprovação dessas mudanças.
Na macroeconomia, já começaram as revisões das projeções otimistas feitas em 2020. Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, corrigiu para contração de 0,5% sua estimativa de variação do PIB neste primeiro trimestre, e avanço muito leve de 0,2% no período de abril a junho. Para o ano, cortou de 5% para 3,3% a aceleração da atividade econômica, destacando que o chamado carregamento estatístico de 2020 para 2021 é de 3,2%. Ou seja, se não houvesse variação nos quatro trimestres, o crescimento terá sido de 3,2%. Por isso, avalia que o "crescimento" de 3,3% agora projetado é "bastante medíocre" e, na prática, significa economia estagnada.
Um experiente analista do mercado financeiro observa, pedindo reserva sobre seu nome, que ainda é cedo para saber quem está nas mãos de quem, com o Centrão do comando do Legislativo e Bolsonaro no Executivo. Se o prazo para mostrar serviço é de três meses, a terça-feira que é feriado em Porto Alegre mas dia útil em quase todo o país foi perdida. Melhor correr atrás do prejuízo.