Era a crônica do pânico anunciado: não satisfeito em trocar o presidente da Petrobras na sexta-feira (19), o presidente Jair Bolsonaro ainda afirmou, no dia seguinte, que tinha "tubarão" na mira e que pretendia "meter o dedo na energia elétrica".
O resultado, no final desta segunda-feira (22), foi um derretimento de 20,48% nas ações ordinárias e de 20,71% nas preferenciais da estatal, que assim acumula perda no valor de mercado de cerca de R$ 100 bilhões somados os dois últimos pregões.
Também desabaram os papéis do Banco do Brasil (11%) e da Eletrobras (0,69%), evidenciando a inquietação com a inflexão populista e intervencionista do governo . Houve ainda perdas nas ações de empresas privadas que atuam no mercado de distribuição de combustíveis e eram candidatas a privatizar refinarias da Petrobras. A bolsa caiu 4,87%.
O estrago não se limitou às ações. Depois de encostar em R$ 5,53, o dólar só fechou um pouco mais moderado, com alta de 1,3%, para R$ 5,45, porque o Banco Central vendeu cerca de US$ 3,4 bilhões para amenizar a desvalorização do real. Para lembrar, o ajuste cambial é uma das regras consideradas até agora pela Petrobras para reajustar o preço dos combustíveis nas refinarias.
No capítulo das altas nocivas, o risco Brasil, medido pelo seguro contra calote representado pelo título chamado Credit Default Swap (CDS), acumula elevação de 14% em dois dias, sexta e segunda-feira. Esse valor exprime a desconfiança dos credores na gestão da dívida brasileira. Também dispararam os juros futuros, que têm como efeito o aumento de custo para financiamento para empresas. As taxas mais "curtas", para janeiro de 2022 passaram de 3,44% para 3,51%.
A coluna perguntou a analistas que estão habituados aos humores normalmente voláteis do mercado se o comportamento desta segunda-feira (22) é apenas uma reação passageira, que voltará ao normal nos próximos dias. Obteve essas respostas:
– Vai haver desdobramentos. O mercado ficou com a pulga atrás da orelha se a Petrobras representa ou não uma guinada na gestão política. Só essa indefinição aumenta o prêmio de risco e muda o patamar das variáveis financeiras como bolsa, juros e câmbio. E não é só uma mudança de preço, mas uma alteração analítica também. Agora todo mundo está buscando pistas da guinada. Nenhum dos governos passados teve uma guinada assim, e o motivo é simples: o custo político é muito alto. Se o presidente está pensando na eleição de 2022, o jeito mais fácil de perder é criando uma nova recessão – disse à coluna Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim (BV).
– O mercado reage assim para indicar ao presidente que não pode agir dessa forma, porque existem regras de governança e compliance (cumprimento de regras) que precisam ser seguidas. A agenda liberal do ministro Guedes parece ter sido totalmente rasgada, o que gera preocupação adicional. O mercado vai reagir negativamente até ter um pouco mais de clareza do que vem pela frente. – completou Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
Se era para passar um recado a Bolsonaro, não funcionou. O presidente dobrou a aposta nesta segunda-feira (22), afirmando que a política de preços da Petrobras "só tem um viés" (de alta, quis dizer), que faz felizes "alguns do mercado".